Marco Civil da internet: Perguntas e respostas sobre o futuro da web no Brasil

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 14/11/2012 às 20:05
Internet-Law FOTO:

Polêmicas sobre neutralidade, direito autoral e lobby de empresas dificultam a aprovação da lei

O Marco Civil da internet vai mudar o modo como nos relacionamos com a internet hoje. E isso vale para empresas, e também para o usuário comum. A legislação vai estabelecer direitos e deveres a todos que usam a rede mundial de computadores no Brasil. Adiado pela quarta vez, a votação deve acontece na próxima semana.

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Elaborada pelo Ministério da Justiça, em 2009, ela começou a ser tramitada ano passado e chegou à Câmara dos Deputados. Se aprovada, passa para o Senado. Segundo o relator Alessandro Molon (PT-RJ), o texto original tem como objetivos principais garantir a neutralidade da rede e a privacidade do usuário.

No entanto, empresas, sobretudo as teles e a indústria do direito autoral, protestam por modificações. Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o Marco Civil estaria ameaçado por esses dois lobbies poderosos.

Segundo o relator, a Câmara deverá se posicionar e decidir se ficará ao lado dos usuários ou das empresas. O NE10 preparou uma série de perguntas e respostas para compreender melhor o Marco Civil e todas as discussões até aqui.

O que é a neutralidade de rede?

Este é - somente - o ponto mais polêmico da nova lei. O texto diz que os provedores devem tratar de forma igual qualquer tipo de acesso, independentemente da origem, destino, serviço ou natureza. Segundo o relator Alessandro Molon, não pode existir discriminação entre usuários, nem censura.

Mas, como isso funciona na prática? Um exemplo: Se uma empresa de telefonia, que também possui serviço de banda larga, se sentir ameaçada com as ligações gratuitas do Skype, ela poderia dificultar esse acesso. A decisão é óbvia. Ela quer manter sua receita com as ligações tarifadas via celular.

Outro exemplo: uma empresa poderia oferecer serviços "premium", que beneficiaria usuários que paguem mais. Ou ainda, o tráfego de downloads de torrents poderia diminuir para quem pagou apenas para ler emails. Se o texto passar, nenhum provedor poderá fazer distinção de velocidade para alguns usuários ou sites. Ou seja: o acesso deverá ser neutro. Não pode haver distinção de um pacote de dados em detrimento de outro. As empresas, através da representante Sinditelebrasil, protestam. Segundo eles, alguns serviços necessitam de prioridades de dados.

Os provedores de acesso poderão guardar meus dados?

Sim, mas apenas por um ano. Segundo o texto, os provedores de acesso deverão manter, em local seguro e em sigilo, os registros de conexão por apenas um ano. A obrigação vale para "administradores de serviços autônomos", ou seja, pessoa física ou jurídica que administra montantes de endereço IP cadastrados no Brasil. Ficam de fora os pequenos provedores, telecentros e lan houses. Apenas uma ordem judicial ou policial poderá solicitar um prazo maior.

O usuário também poderá solicitar a exclusão definitiva dos seus registros. Algumas críticas a essa parte diz que o Brasil fará um caminho inverso no ocorre hoje no mundo, ou seja, a internet como território livre. Outros dizem que a maioria dos sites já possui uma espécie de proteção de dados, através dos "termos de uso".

No entanto, o relator afirma que esse texto vem para evitar que os provedores vendam os dados de acesso para terceiros, a fim de obter lucro.

Sem a neutralidade de rede, até sites de torrents como o Pirate Bay poderiam ser ameaçados (Divulgação)

Minha identidade virtual é sigilosa?

Totalmente. Este é um dos princípios do Marco Civil. Os dados dos usuários só poderão ser repassados em caso de ordem judicial. Segundo o texto, a justiça deverá tomar todas as providências para quem seja preservada a intimidade, a vida privada, a imagem, as informações pessoais, a identidade e a honra do usuário.

De quem é a responsabilidade do conteúdo postado?

Segundo o Marco Civil, não é responsabilidade das empresas o que os usuários postam na rede. Por isso, sites como Facebook, Twitter, YouTube, entre outros, não terão qualquer relação com o que é postado. Eles devem retirar algo apenas se solicitados pela Justiça.

No entanto, a ministra da cultura Marta Suplicy fez um pedido no que diz respeito à infranção de direito autoral. Com a modificação proposta, o site deveria retirar material que viole copyrights sem necessidade de processo judicial. Para a Associação Brasileira de Internet (Abranet), que defende os usuários, a medida pode dar margem à censura e arbitrariedades. "A formalização do pedido de remoção pela Justiça é essencial para a segurança jurídica da internet”, disse o presidente do órgão, Eduardo Neger.

Para o relator Alessandro Molon, o Marco Civil defende o usuário (Foto: AgênciaCâmara/Divulgação)

Mas, o Marco Civil trata de pirataria?

Esta é mais outra dúvida. Há quem defenda que o Marco Civil não trate do assunto, já que uma nova legislação conhecida como "Lei de Direitos Autorais", ainda está sendo discutida no Governo.

O Marco Civil também trata da qualidade do acesso?

Sim. Segundo o texto, as empresas deverão manter a manutenção da qualidade contratada. A conexão também não poderá ser suspensa, salvo débitos do internauta quanto à utilização do serviço.

Quem regula essas novas leis?

Este é outro ponto bem polêmico. Quem regulamenta as teles hoje é a Anatel. No entanto, o Marco Civil quer que o Comitê Gestor da Internet no Brasil (o CGI.br) seja o regulador da rede. Muitos deputados criticam, já que o CGI é uma entidade civil e não tem poder regulador. Uma alteração foi proposta para colocar o Poder Executivo com a responsabilidade. Mas, o texto é vago. Poderia ser o ministério ou a própria presidente.