O TOC é um transtorno pediátrico? "Um terço dos casos aparece antes dos 10 anos", alerta psiquiatra

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 28/10/2017 às 12:24
O TOC pode iniciar em qualquer momento: desde a pré-escola até a idade adulta. Estudos mostram que quase 70% dos casos começam antes dos 18 anos (Foto ilustrativa: Pixabay)
O TOC pode iniciar em qualquer momento: desde a pré-escola até a idade adulta. Estudos mostram que quase 70% dos casos começam antes dos 18 anos (Foto ilustrativa: Pixabay) FOTO: O TOC pode iniciar em qualquer momento: desde a pré-escola até a idade adulta. Estudos mostram que quase 70% dos casos começam antes dos 18 anos (Foto ilustrativa: Pixabay)

Uma aula magna sobre transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), quarto distúrbio psiquiátrico mais frequente (atrás apenas das fobias, depressão e dependências químicas) e que acomete 5 milhões de brasileiros, foi destaque no Congresso Brasileiro de Psiquiatria, que termina, neste sábado (28), em São Paulo. Coordenada pela presidente da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria, Kátia Petribú, a palestra foi conduzida pelo psiquiatra Eurípedes Miguel, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Psiquiatria do Desenvolvimento para Crianças e Adolescentes (INPD). Dados apresentados pelo médico sugerem que a pediatria também deve ter um olhar cuidadoso para a saúde mental.

“Um terço dos casos de TOC aparece antes dos 10 anos; outro um terço, dos 10 aos 18 anos. E na maioria desses casos com sintomas que começam nessa fase da vida até o diagnóstico, passam-se cerca de 16 anos”, alerta Eurípedes, que é líder do Consórcio Brasileiro de Pesquisa em Transtornos do Espectro Obsessivo-Compulsivo (CTOC), que congrega oito centros brasileiros. Entre eles, a Universidade de Pernambuco (UPE). No Estado, os estudos são coordenados por Kátia Petribú. Desde 2008, o CTOC já avaliou 1.001 pacientes e publicou mais de 50 artigos, em períodos científicos, sobre o transtorno. "Conseguimos juntar o maior número de pacientes profundamente estudados."

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Para Eurípedes, a demora entre o início dos sintomas e o diagnóstico pode ser explicada por vários motivos. "Entre eles, estão a falta de conhecimento, a vergonha (para compartilhar os sintomas do TOC com outras pessoas e profissionais de saúde) e falta de serviços habilitados para fazer o atendimento do paciente, que geralmente tende a pensar que os pensamentos obsessivos e compulsão são sintomas exclusivos dele, sem acometer outras pessoas", destaca.

"Cerca de 90% dos pacientes que procuram os serviços especializados têm alguma comorbidade, como transtornos de ansiedade e de humor", destaca o psiquiatra Eurípedes Miguel sobre desafios no tratamento do TOC (Foto: ABP/Divulgação)

Na lista das causas do transtorno, Eurípedes frisa que há diversas condições que se combinam entre si para o aparecimento do quadro. "Estão envolvidos fatores genéticos, familiares e ambientais, além de experiências traumáticas, abuso e aspectos neurobiológicos."

Desafios no tratamento

Para Eurípedes, o maior desafio no tratamento do TOC, é controlar as comorbidades (existência de, pelo menos, um outro transtorno associado ao distúrbio de base). "Cerca de 90% dos pacientes que procuram os serviços especializados no tratamento do TOC têm alguma comorbidade, como transtornos de ansiedade e de humor. Neste último caso, a depressão é a mais prevalente."

O psiquiatra acrescenta ainda que, entre as pessoas com TOC, um terço tem síndrome de Tourette (distúrbio que envolve movimentos repetitivos, como piscar repetidamente os olhos e encolher os ombros, ou sons indesejados). "E quando os pacientes têm a síndrome de Tourette como predominante, metade deles apresenta TOC", diz o psiquiatra.

Democrático, o TOC acomete, em média, 2,5% da população mundial. "Em São Paulo e no Rio de Janeiro, verificamos que essa prevalência é maior, em torno de 4%", informa Eurípedes.

Sintomas

Para o diagnóstico do TOC, é necessária a presença de obsessões, compulsões ou de ambas.

Obsessões

São pensamentos, impulsos ou imagens persistentes e recorrentes que são experimentados como intrusivos e indesejados, causando acentuada ansiedade e desconforto. A pessoa tenta ignorar ou suprimir esses pensamentos com algum outro pensamento ou ação. Alguns exemplos de obsessões: medo exagerado de contaminar-se com microorganismos ou doenças ao tocar objetos do dia a dia; pensamentos recorrentes de que pessoas próximas estejam correndo risco de vida; pensamentos “proibidos” envolvendo sexo ou religião; medo de perder o controle ou de agredir outras pessoas sem justificativa; dúvidas repetitivas sobre atividades corriqueiras, como desligar lâmpadas, trancar portas ou desligar o fogão.

Compulsões

Podem ser caracterizadas por rituais repetitivos ou atos mentais (contar, rezar e outros) que habitualmente diminuem o mal-estar gerado pelos pensamentos obsessivos. Esses hábitos não são agradáveis nem resultam na execução de tarefas úteis. Alguns exemplos de compulsões: lavar excessivamente as mãos para diminuir temor de contaminação; benzer-se repetidamente ou rezar contra “pensamentos proibidos”; verificar repetidamente se a porta está trancada, se as luzes estão apagadas ou se o fogão está desligado; ter que realizar certos atos, na intenção de evitar o acontecimento de desgraças.

Mania ou TOC? 

Para o diagnóstico do TOC, é necessário que as obsessões ou compulsões tomem tempo (mais de uma hora por dia), causem sofrimento ou prejuízo na interação social do indivíduo, nas atividades profissionais e no convívio com amigos e parentes.

Evolução

A intensidade dos sintomas do TOC tende a variar com o tempo. Algumas pessoas podem apresentar períodos com sintomas bem evidentes e outros períodos sem sintomas. Alguns apresentam sintomas constantemente, porém em graus variáveis. Outros apresentam um nível estável de sintomas por toda a vida.

Tratamento 

Primeiramente, é importante conscientizar o paciente e a família sobre o transtorno e o tratamento, baseado em terapia cognitivo-comportamental (TCC) e uso de medicação, de acordo com cada caso.