Presença de vetor da doença de Chagas em residência alerta para risco de transmissão na área urbana

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 21/11/2016 às 17:54
Insetos triatomíneos, popularmente conhecidos como barbeiros, foram encontrados no interior de um tijolo em um nicho de ar condicionado em um condomínio residencial em Boa Vista, Roraima (Foto: Divulgação)
Insetos triatomíneos, popularmente conhecidos como barbeiros, foram encontrados no interior de um tijolo em um nicho de ar condicionado em um condomínio residencial em Boa Vista, Roraima (Foto: Divulgação) FOTO: Insetos triatomíneos, popularmente conhecidos como barbeiros, foram encontrados no interior de um tijolo em um nicho de ar condicionado em um condomínio residencial em Boa Vista, Roraima (Foto: Divulgação)

Vetores reconhecidos da doença de Chagas, insetos triatomíneos da espécie Triatoma maculata foram identificados pela primeira vez colonizando um ambiente domiciliar no Brasil. O achado inédito foi relatado na edição de novembro da revista ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’, recém-publicada online. No artigo, os cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Universidade Federal de Roraima, Secretaria Estadual de Saúde de Roraima e Núcleo de Entomologia do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami contam que 127 triatomíneos, popularmente conhecidos como barbeiros, foram encontrados no interior de um tijolo em um nicho de ar condicionado em um condomínio residencial em Boa Vista, Roraima. Segundo os autores, a descoberta inesperada aponta para um possível aumento do risco de transmissão do agravo no ambiente urbano.

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O estudo reforça a importância de manejo adequado desses animais, considerando a associação do T. maculata com pombos. A identificação de 127 insetos triatomíneos em um edifício residencial na capital de Roraima é o primeiro relato de colonização domiciliar por insetos da espécie T. maculata no Brasil. A descoberta foi feita durante uma aula prática de entomologia, em setembro de 2015. O condomínio foi escolhido como local para coleta devido a relatos de moradores sobre a presença de barbeiros. A infestação massiva em um imóvel com boas condições de construção surpreendeu os pesquisadores. "O fato de que barbeiros T. maculata podem viver em nichos externos em paredes bem rebocadas da habitação humana é um fato novo na epidemiologia da doença de Chagas nas Américas que não deve ser negligenciado", ressaltam os autores no artigo.

Vetores reconhecidos do parasito Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas, os barbeiros T. maculata estão presentes na Colômbia, Guiana, Suriname e Venezuela, além de Roraima, no Brasil. Geralmente, os insetos são detectados no entorno dos domicílios; em ninhos de pássaros, principalmente pombos; galinheiros; chiqueiros e currais. No caso relatado no estudo, os insetos foram encontrados em um condomínio de uma área residencial urbanizada, limitada por uma floresta secundária. Os 127 barbeiros estavam dentro de um tijolo em um nicho de ar condicionado de concreto, no qual também havia presença de pombos. A identificação de insetos em diferentes fases de desenvolvimento, desde ovos até adultos, mostra que a colônia estava estabelecida.

Embora os barbeiros tenham sido encontrados na fachada externa do edifício, os pesquisadores observaram que muitos nichos de ar condicionado eram separados do interior dos apartamentos apenas por papelões e moradores relataram já terem avistado triatomíneos dentro dos imóveis. Considerando a proximidade frequente entre ninhos de pombos e residências, os cientistas avaliam que a capacidade do T. maculata para colonizar imóveis pode aumentar o risco de transmissão da doença de Chagas no ambiente urbano. “A possibilidade de expansão da distribuição geográfica de T. maculata por meio de transporte passivo por pombos, a possibilidade de encontrar animais infectados pelo T. cruzi e a colonização da habitação humana são importantes fatores de risco para a transmissão vetorial urbana de T. cruzi que devem ser abordados com o devido cuidado e urgência”, destacam.

A Secretaria de Saúde de Roraima se responsabilizou pelos procedimentos de desinfestação. Os triatomíneos coletados na pesquisa ainda serão analisados para verificar a possibilidade de infecção pelo T. cruzi. os artigos publicados no periódico ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’ podem ser acessados gratuitamente online no link: memorias.ioc.fiocruz.br.