Agravamento da pandemia da covid-19 reaquece debate sobre continuação das competições de futebol

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Carolina Fonsêca

Publicado em 04/03/2021 às 21:40
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CAROLINA FONSÊCA E DAVI SABOYA 

A pandemia da covid-19 continua se agravando no Brasil e o debate em torno da continuação dos campeonatos de futebol voltou à tona. Só na última quarta-feira (3), o país registrou mais de 1.900 vidas perdidas para o coronavírus em apenas um dia – número recorde. Ao mesmo tempo que milhares de brasileiros choram seus mortos ou agonizam à espera de um leito de UTI, a bola rola no futebol brasileiro. O calendário de competições está repleto de partidas, algumas ainda remanescentes da temporada 2020 e outras de campeonatos da temporada 2021 que estão começando.

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No início da noite desta quinta-feira (4), o Ministério Público informou que irá recomendar à CBF a suspensão de todas as partidas de futebol no Brasil, segundo o portal do Globo Esporte. Valberto Lira, presidente da Comissão Nacional, informou que a Comissão decidiu emitir uma nota técnica recomendando à CBF a suspensão de toda e qualquer competição por ela organizada, em face da situação que o Brasil atravesse hoje.

Apesar da crise sanitária em níveis alarmantes, para o presidente de Federação Pernambucana de Futebol (FPF), Evandro Carvalho, parar o futebol seria um "exagero sem precedentes", uma vez que, na opinião dele, nenhum segmento consegue criar um ambiente tão seguro quanto o do futebol. "É um desconhecimento de quem alega ou pleiteia isso do ambiente que é o futebol. Não existe nenhum segmento que mantém protocolos tão rígidos e seguros como o futebol. Qual jogador teve sintomas? Nenhum. Qual jogador foi internado com covid-19? Nenhum. Qual jogador foi a óbito? Nenhum. Atletas e comissões técnicas são testados semanalmente, têm um rigoroso tratamento. Se parasse o futebol, nenhuma outra atividade poderia funcionar. Nenhum segmento tem o nível de rigor do futebol", garantiu.

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Várias figuras do futebol se posicionaram sobre o assunto nos últimos dias, dando maiores proporções ao debate. Uma das falas que teve amplo destaque foi a do técnico do América-MG, Lisca. Após a partida contra o Athletic, na noite da quarta-feira, pela segunda rodada do Campeonato Mineiro, o treinador pediu o adiamento da Copa do Brasil.

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"Eu não sei de parar campeonato. Agora, uma coisa eu tenho certeza. A Copa do Brasil nós vamos ter que repensar. São 80 times do Brasil inteiro, e nós não podemos botar 80 delegações dentro de avião, de aeroporto", disse. "Tem pessoas que pegam e morrem, tem pessoas que pegam e nada acontece, tem pessoas que são intubadas e agora você nem pode mais intubar. Eu vi ontem o procedimento de intubação. O que está acontecendo com o nosso país? Nós precisamos nos posicionais, precisamos lutar contra isso", completou. Na mesma fala, o técnico do América-MG ainda citou que está perdendo amigos e lembrou a morte do treinador Ruy Scarpino, que faleceu de covid-19 nesta semana, e mencionou outros nomes. "Para quem não conversou ainda com uma pessoa que passou por isso, eu recomendo", recomendou.

Além de Lisca, também se manifestaram sobre o assunto os técnicos do Palmeiras e do Grêmio, Abel Ferreira e Renato Gaúcho e o jogador Breno Calixto. As opiniões variam.

O zagueiro Breno Calixto, que tem passagem pelo Náutico e atualmente defende o Madureira-RJ, chegou a publicar em sua conta no Twitter postagens criticando o técnico Lisca, justificando que é fácil para alguém que tem a posição e o salário que ele tem defender a paralisação da Copa do Brasil. Horas depois, porém, o jogador apagou as postagens, mas compartilhou um print de texto de uma outra pessoa também criticando a fala de Lisca.

O português Abel Ferreira classificou o coronavírus como "um adversário que não tem dó", recordou os dois lockdowns realizados em Portugal e revelou que teme um surto de covid-19 no elenco do Palmeiras, após o jogo contra o Corinthians, na quarta-feira, já que o Timão enfrenta um surto da doença no momento. Renato Gaúcho, no entanto, tem opinião parecida com o presidente da FPF e afirmou, também na quarta-feira, que o "futebol é o lugar mais seguro" e está beneficiando o povo sendo um motivo a mais para que as pessoas fiquem em casa.

Fora do âmbito do debate, em alguns Estados medidas já estão sendo efetivamente tomadas. Em Santa Catarina e no Paraná, as federações estaduais optaram pela paralisação dos campeonatos Catarinense e do Paranaense. No Ceará, o Estadual também não poderá ter jogos realizados na capital Fortaleza.

Em seu último boletim, o governo de Santa Catarina informou que há 694.274 casos confirmados de covid-19, com 7.709 mortes e mais 91 óbitos foram registrados na atualização desta quinta-feira (4), junto com um aumento de 5.674 casos confirmados. No Paraná, segundo a Secretaria de Saúde do Estado, 5.386 novos casos da doença e 110 óbitos foram confirmados, elevando o número de mortes por coronavírus no Estado para 11.993 e o de infectados para 661.791. No Ceará, foram registrados 4.092 novos casos e 58 mortes nesta quinta. Dessa forma, o estado soma 437.017 casos de coronavírus com 11.506 óbitos.

Em comparação aos Estados citados, pode-se dizer que Pernambuco está em situação menos grave. Mas não é certo pensar que está tudo bem. Entre essa quarta (3) e quinta-feira (4), o Estado confirmou mais 1.685 infecções pela doença, sendo 82 de pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), totalizando 304.732 infectados.

Para o presidente do Sport, Milton Bivar, o técnico Lisca está certo no que diz respeito às viagens dos times, já que o deslocamento representa um risco para jogadores e comissões técnicas. "Como bem falou o Lisca, o time sai do Norte, Nordeste, para jogar no Sul, sem estar muito preparado, enfrentando viagens longas, enquanto o outro está lá esperando", pontuou. O mandante rubro-negro aproveitou para defender sua teoria de que "em condições normais", em que a pandemia não esteja em situação de pico, ele não vê razão para não haver jogos de futebol e público nos estádios. "A partir do momento que você faz um protocolo rígido, usando máscara, com álcool em gel, se houver protocolo rígido não vejo nada de mais nisso", afirmou, sugerindo ainda que as partidas acontecessem apenas com 20% da capacidade dos estádios, por exemplo.

O Sport é um dos representantes de Pernambuco na Copa do Brasil e tem sua estreia na primeira fase da competição marcada para o dia 10 de março, contra o Juazeirense, em Juazeiro, na Bahia. O Santa Cruz estreia no dia seguinte, 11 de março, diante do Ypiranga-AP, em Macapá, o Retrô recebe o Brusque-SC no dia 17 de março, no Recife, e o Salgueiro enfrentará o Corinthians, também no dia 17 de março, em Salgueiro.

O pernambucano que fará o maior deslocamento para estrear na Copa do Brasil é o Santa Cruz. Na opinião do executivo de futebol do Tricolor, fazer uma pausa nos calendários agora é um decisão muito difícil. "Envolve saúde, envolve vidas, temos que ter um cuidado muito especial em relação a isso. Na contrapartida, acho que o grupo que mais se cuida e é testado para a covid-19, há quase um ano, é o futebol. Nós aqui no Santa estamos desde junho fazendo testes semanais, às vezes até duas vezes por semana. O futebol é, certamente, o nicho de pessoas que mais se cuidam, ao mesmo tempo você encontra ônibus lotados, aviões cheios e estádios vazios. Decisão difícil, mas envolve pessoas, empresas que estão falindo, tem que ter um meio termo que atenda a todos, claro que sempre na frente o principal: a vida", analisou.

Em relação aos longos deslocamentos, Nei concorda que nos aviões e aeroportos o elenco e a comissão ficam, de fato, mais expostos. Ele citou, inclusive, que boa parte do elenco coral já teve a covid-19. Mas, com exceção do estadual, onde a exposição nas viagens é menor, o dirigente não vê tanta diferença entre viajar para disputar a Copa do Nordeste e viajar para disputar a Copa do Brasil.

Diferente dos tricolores, o Carcará não precisará sair da cidade de Salgueiro, no Sertão do Estado, para fazer seu primeiro jogo. O Corinthians é quem sairá de São Paulo até lá. Mas vale ressaltar que o Timão registrou 19 casos de covid-19 nesta semana, sendo oito em jogadores. "O Corinthians acabou de jogar contra o Palmeiras. Se fosse o Salgueiro que tivesse 19 casos de covid-19 era difícil, porque não tinha (elenco), mas o Corinthians tem jogador demais, não tem essa dificuldade. É preocupante, mas todo mundo faz teste antes da Copa do Brasil, Copa do Nordeste e só joga quem testa negativo. Hoje mesmo fizemos testes para a Copa do Nordeste, domingo", avaliou José Guilherme, presidente do Salgueiro.

Quanto a relação entre futebol e pandemia, o presidente do Carcará ressaltou que é preciso entender que a pandemia é real, mas que os contratos com atletas e funcionários também são. "Não sei o que será dos clubes se não tiverem os campeonatos, as cotas, como a gente vai pagar funcionários a tempo", disse, lembrando que o próprio Salgueiro depende das cotas para sobreviver e que os adiamentos no calendário também geram custos.

Apesar de estar fora da Copa do Brasil, o Náutico também vê os longos deslocamentos com preocupação. Diógenes Braga, vice-presidente do Timbu, acredita que o ideal a se fazer neste momento é ouvir as autoridades. "É evidente que todos esses deslocamentos não são simpáticos ao que tem se vivido no país. As paralisações dificultam ainda mais a vida do futebol, mas a gente entende que tem que sempre priorizar a segurança da população. É realmente uma situação de se confiar nas autoridades. Esse é o ponto", disse. Diógenes também reforçou que o Náutico vai obedecer todas as determinações que forem feitas.

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