Diretor criativo da Melissa, Edson Matsuo prega a valorização das emoções pessoais no ambiente de trabalho

ROMERO RAFAEL
ROMERO RAFAEL
Publicado em 14/08/2018 às 19:45
Edson Matsuo - Foto: Paulo Almeida / Divulgação
Edson Matsuo - Foto: Paulo Almeida / Divulgação

Self-hacking. Não há tradução em português muito apropriada para esse conceito. Mas ele aconselha a gente a mergulhar no nosso interior em busca de tesouros perdidos - ou aprisionados - ao longo da vida, desde a infância, resgatando talentos, aguçando o poder criativo, inspirando-se. Na cauda dessa ideia, a valorização das emoções pessoais no ambiente de trabalho. Foi o que nos apresentou Edson Matsuo, diretor de criação (ou ativista criativo, como ele prefere ser apresentado) da Melissa há 34 anos. Em passagem pelo Marco Pernambucano da Moda, no Recife, ele falou ainda sobre criatividade, inovação e sustentabilidade, temáticas tão em alta. Acompanhe:

EMOÇÕES

O que é self-hacking?

É conectar-se, para quebrar códigos e libertar o seu talento e a sua criatividade; procurar tesouros que foram aprisionados em você por “n” questões – uma delas, a escola tradicional, que valoriza o que você não sabe, e não o que você sabe.

É autoconhecimento...

É autocura, que já é algo mais forte.

E é possível aplicar esse conceito numa indústria?

Sim, nós estamos fazendo e é muito coinspirador! Há um exercício, um check-in emocional coletivo, que funciona assim: numa reunião, a pessoa, ao chegar, escreve no quadro a sua emoção – se é raiva, por exemplo – e todos comentam sobre ela. No fim, há um check-out emocional.

Seria algo como uma terapia em grupo?

Quantas vezes você está com uma preocupação muito grande e não tem espaço para falar sobre isso no trabalho? Ou mesmo quando está feliz... É uma coisa muito simples, mas não é comum, porque a gente vem de um histórico em que a emoção é colocada para fora do ambiente de trabalho.

A pessoa, uma vez entendida, de fato, é outra coisa...

É você ser entendido e entender o outro. É um contexto novo para uma máquina de produção.

Então, lugar de trabalho também é lugar para emoções...

Só é! Emoção gera ação e é a alma do trabalho que você faz.

CRIATIVIDADE E INOVAÇÃO

Edson, há hoje muita informação e muitas ideias chegando a toda hora. Como ser criativo nesse turbilhão e sob a pressão do 'seja criativo'?

Criatividade não é algo que se quer e faz; não é quero ser, sentei e vou ser. Tem que criar o contexto... E as melhores coisas que eu tenho visto são totalmente fora do ambiente 'tem que acontecer' - inclusive, muitos projetos deram errado de um lado, mas certo de outro. Eu sou um cara que deu 'errado' - sou arquiteto, não estudei design, mas as pessoas falam que eu sou designer.

Mas do que você se alimenta?

Eu vejo várias coisas, me coinspiro - se você está inspirado, você se inspira - e tem os insights. Também gosto de misturar coisas. Por exemplo, estou querendo juntar design, ontologia e constelação familiar. O que vai dar? Não estou preocupado. E sorte que não sei! Tem a ver com a imprevisibilidade de se fazer algo; é a ambição de fazer, e não a expectativa. A expectativa pode te conectar à frustração e à culpa, porque você já contou com o resultado - e não com o movimento -, só aquilo não existe, é irreal e é sempre mais do que pode. A ambição, sim, é uma coisa legal de você ter, porque é um movimento para chegar lá, mas sem contar com aplauso ou sucesso.

É aí que entra a inovação?

No meu conceito, você não inova, você faz para inovar. Quem inova são as pessoas, se elas gostam e aderem exponencialmente ao que você fez. A inovação é fato, mas acontece fora. Você falar que eu fiz um projeto inovador é uma arrogância. Pode ser uma invenção, mas não uma inovação. São conceitos diferentes. Então, eu faço projetos para inovar, não faço projetos inovadores; inovação é uma busca e uma crença, e não um processo. Você acredita que pode virar inovador, e essa humildade é importante.

Também te prepara para lidar com as falhas...

Não é falha, é um ruído. Quando você coloca falha, você sai num circuito muito perigoso, de erro, repulsa, culpa e poder. Quando você compreende, no lugar do erro há ruído; no lugar da repulsa, acolhimento; da culpa, alegria, e no lugar do poder de alguém te julgar, fica um aprendizado.

SUSTENTABILIDADE

Mudando de assunto: a Melissa é feita de plástico e – inclusive, na moda – a sustentabilidade é um assunto em discussão.

Nós estamos preocupados com o plástico reciclado – o nosso já é limpo de metais – e estamos fazendo projeto de logística reversa, mas também tem a ver com a educação das pessoas: o canudinho, por exemplo, não tem perna pra cair no mar...

Agora, você viu o TEDx do papa Francisco? Ele fala aos jovens que estão preocupados com o descarte de material, mas não com o descarte humano. Who made my clothes? [diz apontando para o cartaz da campanha “Quem fez minhas roupas?”, possível de ver na foto que abre este post] Como é comprar roupa de um lugar que tem assédio moral, ou sexual? Quanto sofrimento há quando você não coloca as emoções no trabalho? Não se fala sobre isso, talvez, porque não seja tão glamoroso do que dizer 'eu reciclo material'.

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