Audiência de "Velho Chico" supera as quatro anteriores; a gente analisa o capítulo de estreia

ROMERO RAFAEL
ROMERO RAFAEL
Publicado em 15/03/2016 às 15:25
iolanda-e-afranio FOTO:

Um coronel e seu rival, uma mãe que prefere um filho a outro, um casal impossível, sertanejos desidratados de fome e sol. Todos esses tipos, comuns às telenovelas e à imagética do Sertão, estão em Velho Chico, novo folhetim das nove da Globo, que estreou nesta segunda (14) com audiência maior do que as registradas nas estreias das quatro novelas anteriores do horário. Foram 38 de média no Rio e 35 em São Paulo. No Twitter, a hashtag #velhochico chegou aos trending topics mundiais.

Velho Chico é um corte brusco em relação à novela anterior, A Regra do Jogo. O seu autor, Benedito Ruy Barbosa, é - diferentemente do antecessor, João Emanuel Carneiro - apegado às fórmulas que consolidaram a telenovela brasileira como um gênero. Não há invencionices da parte dele; os personagens não aparentam dubiedade; o ritmo é outro: no término do capítulo não houve, por exemplo, um gancho surpreendente para o segundo, tipo uma ação para ser continuada no capítulo seguinte ou um personagem congelado, "pego com a mão na botija"... Muito pelo contrário: num plano aberto, Encarnação (Selma Egrei), sentada num banco sob uma árvore, olhava o rio; a imagem tinha um filtro azul. O capítulo terminou assim, poeticamente.

A poesia visual do diretor Luiz Fernando Carvalho é a embalagem que a trama - tradicional - precisa. É certo que há público garantido para o velho confronto de famílias no Sertão; mas há outra fatia que, hoje, só para em frente à TV se houver um frescor - no caso da casadinha Benedito Ruy Barbosa e Luiz Fernando Carvalho, o trunfo é, mesmo, cuidar da embalagem; caprichar na forma. Na apresentação dos personagens, comum no capítulo de estreia, a forma de mostrar o amor de Eulália (Fabiula Nascimento) por Ernesto Rosa (Rodrigo Lombardi) rendeu a mais bela cena da noite: como que numa coreografia, ele chega em casa e se encaminha para o banho; ela percorre o movimento dele com os olhos, respira diferente, deseja-o.

Lombardi, aliás, criticado por sua atuação engessada em Verdades Secretas, entregou uma interpretação teatral quando contracenou com Tarcísio Meira (coronel Jacinto), também ótimo, fazendo um misto de asqueroso e frágil, na participação que se resumiu ao primeiro capítulo. Rodrigo Santoro (Afrânio), o maior destaque do elenco pela volta às novelas, funcionou bem em dupla com Carol Castro (Iolanda). Inseridos na capital, os personagens foram postos em situações mais ousadas: uma cena de festa lembrou a liberdade e o desbunde da trupe Chão de Estrelas, do filme pernambucano Tatuagem, de Hilton Lacerda. Havia gente tatuada, guitarra elétrica, um clima psicodélico, tropicalista, que se contrapôs ao Sertão.

A nudez de Carol Castro - primeiro coberta junto à nudez de Rodrigo Santoro, deitados na cama, e depois com peito e bunda à mostra - esquentou. O figurino de sereia usado por ela conquistou fashionistas. Quando cantou, chorando, Meu Primeiro Amor, de Cascatinha, afagou os corações... E noveleiros têm de ser acertados pelo coração, senão não há conquista.

A trilha sonora, aliás, foi o quesito mais elogiado, depois da fotografia da novela. Pudera: tem Como 2 e 2, na voz de Gal Costa, Triste Bahia e Tropicália, esta na abertura, ambas com Caetano Veloso; Peixe, na gravação dos Doces Bárbaros, e a própria Meu Primeiro Amor, na voz de Maria Bethânia. Virão pela frente Flor de Tangerina, de Alceu Valença; Gemedeira, de Amelinha; Chico César cantando Serenata, versão para música de Schubert; a rabequeira Renata Rosa, em Me Leva; Marcelo Jeneci cantando Veja Margarida, de Geraldo Azevedo... Um verdadeiro oásis aos ouvidos, depois do funk quase absoluto em A Regra do Jogo.

Sobre a direção, Luiz Fernando Carvalho vai além dos planos abertos e investe em closes, detalhes... A dúvida é se ele conseguirá segurar essa estética até o final, levando em consideração que novela é um produto extenso demais, de muitos profissionais, cenas e personagens, e é também uma obra aberta, sujeita a mudanças, bruscas até. No capítulo de estreia, retratando a seca, a direção dele deu alguma respiração ao tema já tão ofegante. Os atores Chico Diaz (Belmiro) e Cyria Coentro (Piedade), como o casal que vai sobrevivendo na sequidão, eram só sofrimento, desde o olhar. Terminam as cenas dizendo "Os homens do governo não iam mentir", como que estabelecendo uma ponte com a atualidade.

Foto: Caiuá Franco/TV Globo

Leia mais:

Nudez de Carol Castro em "Velho Chico" fez sucesso na internet

Os memes de Velho Chico

Últimas notícias