"Eu sou o Brasil que o Brasil não conhece", diz Naná Vasconcelos

Mirella Martins
Mirella Martins
Publicado em 24/07/2015 às 11:51
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Fotos: Edmar Melo/JC Imagem Fotos: Edmar Melo/JC Imagem

O percussionista Naná Vasconcelos está organizando um workshop orgânico, promovendo autoconhecimento, sensibilização, relaxamento, senso de grupo e concentração. A aula, aberta ao público e marcada para este sábado (25), será realizada no Museu de Artes Afro-Brasil Rolando Toro, às 9h30. O Social1 teve a oportunidade de conversar um pouco com Naná e saber mais detalhes sobre o processo de desenvolvimento da aula e também sobre a influência da cultura africana na sua arte.

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"Eu chamo de workshop 'orgânico': o entendimento dos ritmos através do corpo. É uma teoria minha e eu acho que, de uma certa maneira, provo isso na minha música", começou a explicar Naná. "Todos os ritmos, todos eles, estão entre um passo e outro. Normalmente, os indianos dizem que a música não é o 'dó, ré, mi, fá, e sol'. A música é o que está entre uma nota e outra. No meu caso, a música está entre um passo e outro. Eu faço uma roda e todos começam a andar sem sair do lugar e, dessa maneira, a coisa vai evoluindo em diferentes ritmos", reflete.

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No workshop aplicado por Naná, a prática é primordial, porém sempre aliada à teoria. "Eu converso sobre a espinha dorsal da cultura brasileira, que é a África. Falo da miscigenação e da riqueza que existe no Brasil. O ponto mais importante é que muita coisa veio da África para o Brasil e se encontraram aqui pela primeira vez. O berimbau, por exemplo, vem de um local e a capoeira de outro, nunca estiveram juntas no continente africano, mas aqui convivem juntos", explica. "No workshop, eu dou muita informação teórica e ponho na prática essa ideia de aprender fazendo. Também falo dos ritmos das diferentes culturas. Por exemplo, o norte-americano vai bater palma no contra-tempo, e nós, brasileiros, batemos no tempo. Eu já morei e realizei aulas lá e é difícil para eles acompanharam o ritmo da maneira que fazemos e durante as aulas as pessoas descobrem que são capazes de fazer coisas que achavam muito complicadas".

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"Tudo é natural", enfatiza Naná durante a conversa. "Nada é forçado. Eu criei esse tipo de ideia de uma certa forma por causa da solidão, pois fiquei muito tempo sozinho pelo mundo. O fato de eu não fazer parte da moda, me dá o direito de ousar, de ter minhas ideias e vir expor para o público. O workshop é bom pois sou livre para mostrar o que eu penso e também para colocar em discussão. Eu quero ouvir a opinião das pessoas, isso é importante para mim e meu trabalho", conclui.

Sentando em meio às almofadas do museu, Naná reflete muito sobre sua arte e também sobre a música brasileira, que possui influência de Villa-Lobos. Ele a divide em dois segmentos: música popular e para pular. "Eu sou o Brasil que o Brasil não conhece. O que toco não faz parte do que acontece na música popular, nem para pular, mas é brasileiro. Cada ritmo de cada lugar se comporta de uma maneira diferente. Eu brinco dizendo que o pernambucano brinca, mineiro se esconde, carioca enrola, são paulo propaga e consome, baiano beija e ganha tudo  (risos)".

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A música é realmente um assunto que o percussionista se empolga e divaga sobre diferentes ramos da sonoridade. Ele fala que em seus shows gosta de trazer os sons da natureza e que vai explanar esses pontos durante o workshop, que, a depender do público, poderá ganhar mais sessões no Recife. O folclore, que Naná aponta como uma das principais formas de educar as crianças, também é colocado em pauta, sempre fazendo ligação com raízes africanas.

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Sobre a idade e projetos na carreira, Naná está perto de completar seus 71 anos. Para celebrar a data, o percussionista está construindo um novo instrumento chamado "pinibaque", que é feito de pinicos e bacias. "Fui chamado para o Festival Internacional de Teatro de Objetos e precisei criar um novo utensílio. O pinico de ágata tem uma sonoridade incrível. Também acabei de fazer um disco que está para sair no final de agosto. É um projeto com Zeca Baleiro e Paulo Lepetit, chamado Tem Café no Bule", contou.

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