"Eu não tiro férias", conta o Palhaço Chocolate em entrevista exclusiva

Mirella Martins
Mirella Martins
Publicado em 11/10/2014 às 14:09
Fotos: Dayvison Nunes/JC Imagem
Fotos: Dayvison Nunes/JC Imagem

O Palhaço Chocolate é um ícone infantil que faz sucesso em Pernambuco há várias gerações. O personagem nunca tira a fantasia e, há 39 anos, popula o imaginário da criançada com suas brincadeiras e alegrias contagiantes. Quem dá vida à figura sempre colorida e sorridente é o ator, psicólogo, pedagogo e arte-educador olindense Ulisses Dornelas, cuja vida inteira dedicou à atividade de palhaço.

Fotos: Dayvison Nunes/JC Imagem Fotos: Dayvison Nunes/JC Imagem

Praticamente toda criança pernambucana sabe quem é o Palhaço Chocolate e gostaria de conhecer mais um pouco sobre este protagonista dos espetáculos infantis regionais. Em uma homenagem especial ao Dia das Crianças, neste domingo (12), Social1 conversou com Ulisses - ou Chocolate - e descobriu histórias da infância, trajetória e ideias do pernambucano. Confira o bate-papo na íntegra.

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Como tudo começou? Conte-nos sobre o início desta trajetória.

O Palhaço Chocolate começou já na infância, quando eu tinha 5 ou 6 anos. O teatro faz parte da minha vida desde criança. Eu comecei trabalhando com teatro infantil... Aí veio a Família dos Bombons. Neste movimento, a gente trabalhava com recreação, fazendo festas para empresas, eventos, aniversário, escolas, etc. Cada um tinha o nome de um bombom e eu me batizei de Chocolate, por isso, o nome até hoje. A partir daí, eu fui desenvolvendo um projeto próprio, voltado para o teatro, dança, música, circo, performance - tudo sempre com o foco no mundo infantil. Trabalhei muitos anos no Teatro do Parque e Santa Isabel, sempre ligado a esse meio.

Como foi sua infância e a criação de seus pais?

Eu nasci e cresci em Olinda e me inspirei bastante nas maravilhosas paisagens da cidade. "Ó linda situação para se construir uma vila", já dizia Duarte Coelho! A minha mãe, Maria do Carmo, era uma professora primária, ligada ao ensino fundamental e gostava de dar aula cantando. Eu gosto de lembrar disso. Ela tocava instrumento, recreando com seu alunos e tal. Então, acho que essa veia ligada à arte veio dela. O meu pai, Adalberto, era um militar, uma pessoa mais sisuda. Eram dois extremos (risos).

Você também tem algumas formações acadêmicas, não é?

Sim. Ao longo do processo, eu procurei me aprimorar. Sou ator por formação, fiz faculdade de teatro. Além disso, fiz curso de pedagogia, psicologia e marketing. Depois que a ligação com o crico e o teatro deram lugar a grandes eventos - como estádios de futebol, praças, ginásios, viagens -, eu comecei a sentir a necessidade de aperfeiçoar meus métodos. Até porque a criança de hoje não é a mesma criança de 40 anos atrás, não é? Além de divertir, a gente também se preocupa em deixar uma mensagem de educação.

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Quem são os seu ídolos?

Meus ídolos são os grandes palhaços do Brasil, sem dúvidas. Torresmo, Carequinha, Piculino. Minha vida é toda dedicada a isso.

Você imaginava que chegaria onde chegou, que alcançaria um público tão vasto durante todos esses anos?

O Palhaço Chocolate nunca "chegou". Ele vai sempre chegar, tá? Então, eu acho que o sucesso ele acontece por etapas: cada passo que damos tentando nos superar. Acho que fazer arte no Brasil é muito difícil; para criança é mais difícil ainda; e no Nordeste, nem se fala! Mas a gente conseguiu se sobressair. Ao longo desse processo, a gente foi criando um público que nos acompanha. Sempre fomos respeitados pelas empresas com trabalhos voltados à criança. E, hoje, a gente mantém esse espaço novo [Teatro Boa Vista, na Região Central do Recife], onde a gente faz permanentemente esse trabalho, com toda uma agenda cultural - de janeiro a dezembro.

Mas qual o segredo desse sucesso permanente, dentro de um cenário com tantas dificuldades? Você realmente conquistou um ótimo espaço na cidade e muita gente o considera um grande empreendedor, inclusive.

É, acho que o segredo é trabalhar com determinação, muita vontade e prazer. E a gente vai construindo, a cada momento, um espaço novo. Estamos sempre atentos ao mercado, ao novo público que está chegando, na formação de novas plateias... Então, a gente vai unindo tudo isso e se moldando. Mas o grande segredo do sucesso é fazer com muito amor tudo aquele que você se propõe a fazer. Outra coisa, né...? Quem é o Palhaço Chocolate? É gordo, magro, moreno, alto? Esse mito continua até hoje. Eu só apareço a caráter. A gente está sempre mexendo com o imaginário infantil, aquele mistério da fantasia, alegria, festa o tempo todo.

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Há, na sua trajetória, alguma história divertida? Algum episódio que o marcou?

Com quase 40 anos de Palhaço Chocolate, existem muitas histórias maravilhosas! Certa vez, a gente estava fazendo o lançamento de um produto nacional, viajando de estado em estado, correndo... E, de repente, no trajeto entre a Bahia e o Ceará, eu acabei esquecendo a minha roupa - que sempre está comigo. Quando cheguei em Fortaleza, que me dei conta, eu gritei: "Olha, o avião não vai embora sem eu recuperar a minha fantasia!". Foi uma confusão. Eu correndo atrás da mala e a equipe desesperada... A gente chegou a correr pela pista pra impedir o avião de decolar!

E vocês conseguiram recuperar a roupa?

Não (risos)! O avião decolou com a roupa. A gente teve que improvisar uma nova fantasia. O espetáculo não pode parar.

Houve algum momento em que você pensou em desistir, largar tudo?

Nunca. Nunca pensei, porque quando você faz algo com determinação e amor, em nenhum momento você pensa em parar. Na verdade, nós tivemos um tempo de dificuldade muito grande no País. Na época do AI-5, da ditadura militar, quando não se podia fazer espetáculos sem censura... Eu me vi sem alternativa para poder levar o meu trabalho adiante. Aí, comecei a fazer um show que passasse mais mensagens cheias de metáforas. Tipo Os Saltimbancos, que passa uma mensagem de união do povo, de fortalecimento das pessoas quando estão juntas... Mas eu nunca desisti.

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O que é a arte para você, afinal?

A arte é o grande diferencial da humanidade, ela sensibiliza, nos transporta para dentro dos sonhos. Ela faz com quem nós amadureçamos, nos conheçamos melhor. E o teatro tem esse papel muito completo. Ele reúne a literatura, a música, dança, performance, circo, cenografia, carpintaria. O teatro consegue reunir várias artes em seu arsenal.

Você disse que já viajou bastante. Conte de alguma dessas viagens.

Eu já viajei do Amazonas ao Rio Grande do Sul. Fui para Miami e Orlando [nos Estados Unidos], num trabalho de pesquisa. Eu fazia várias excursões para o exterior. Quando começou a moda de viagens de adolescentes comemorando aniversário na Disney, eu fui para lá conhecer o lugar, a magia que encantava o pessoal. Não fui como turista, mas como um profissional que foi analisar o que havia lá. Eu achei tudo muito bonito e mágico, mas acho que aqui tem coisas muito mais interessantes. A gente dá um banho neles [os americanos].

Como o quê, por exemplo?

O nosso Carnaval é muito mais encantador do que tem lá. A gente tem uma coisa muito nossa que é saber fazer festa, saber viver com alegria. Somos um povo alegre, apesar das nossas dificuldades regionais. Lá, é tudo muito bem feito, mas muito mecânico. Outro exemplo: achei lindo o mar artifical em Miami e os golfinhos fazendo acrobacias, tudo mais. Mas, quando você vem para Fernando de Noronha, a gente vê os mesmo animais, só que de uma maneira muito mais natural...

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Quem é Ulisses Dornelas?

É um artista, um circense, um ator. Autor, roteirista, encenador. Ulisses é onde fica a fábrica de criação do Palhaço Chocolate. É quem está sempre criando, sempre elaborando, pensando numa música, num espetáculo, num grande evento. Até porque a criatividade é a felicidade do artistas. O Ulisses está sempre buscando coisas novas, buscando encantar o meu público, e que também vê mundo de uma forma muito positiva, feliz. Ele acredita no amor e nas pessoas. E esse é o olhar que é transmitido ao Palhaço Chocolate. O Ulisses é um artista permanentemente a serviço do Palhaço Chocolate. Nós - Ulisses e Palhaço Chocolate - não tiramos férias.

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