Nova regra de direitos autorais da União Europeia pode beneficiar mídia

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 13/09/2018 às 8:32
Parlamento Europeu (AFP PHOTO / FREDERICK FLORIN)
Parlamento Europeu (AFP PHOTO / FREDERICK FLORIN) FOTO: Parlamento Europeu (AFP PHOTO / FREDERICK FLORIN)

Por Mariana Lima (Estadão Conteúdo)

O Parlamento Europeu aprovou na quarta-feira, 12, o texto do projeto de lei que vai atualizar as regras de direitos autorais para países pertencentes ao bloco - que inclui dois artigos polêmicos, um referente a pagamentos de conteúdos de empresas de mídia e entretenimento e outro sobre proteção de obras reproduzidas na web. A decisão final sobre a legislação, no entanto, só virá em janeiro de 2019.

Com as mudanças, as companhias de mídia passariam a ter o direito de exigir pagamentos de empresas de tecnologia quando trechos de notícias e outros conteúdos forem publicados em suas plataformas, como redes sociais, por exemplo. Além disso, os membros do parlamento decidiram, por 438 votos a 226, pela criação de regras que tornem empresas de tecnologia proativas no combate à violação de direitos autorais.

Mídia

O projeto dá a donos de jornais, gravadoras e produtoras de cinema o direito de exigir pagamento por compartilhamento de trechos de suas propriedades em plataforma de terceiros. A decisão afetaria diretamente Facebook e Google, que hoje reproduzem parte de reportagens e outros conteúdos, sem pagar nada por isso.

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O projeto de lei não especifica a forma de ressarcimento, mas a expectativa é que as empresas de tecnologia desenvolvam ferramentas para facilitar o processo de cobrança e pagamento. Para Carlos Liguori, especialista em direitos autorais e coordenador de projetos em Inovação em Direito na Fundação Getulio Vargas (FGV), o artigo foi criado para apaziguar os nervos dos empresários de mídia. No entanto, segundo ele, essa pode não ser a melhor estratégia.

O especialista acredita ser possível que empresas como o Facebook criem estratégias para que companhias de mídia se sintam desestimuladas a compartilhar seu conteúdo na plataforma, numa tentativa de evitar o novo gasto. "Do jeito que foi criado, o texto pode contribuir para aumentar a propagação de notícias falsas".

Proteção de obras

A nova lei deverá substituir a legislação vigente, criada em 2001, e que já atribuía algumas responsabilidades ao setor de tecnologia, como a obrigatoriedade de retirar do ar obras veiculadas sem autorização do detentor do direito autoral, quando este se queixar.

Outro artigo polêmico do projeto de lei obriga as empresas a fiscalizarem se arquivos enviados a suas plataformas ferem direitos autorais. Assim, antes de permitir a publicação de um vídeo no YouTube, por exemplo, a plataforma do Google teria de se certificar se este não inclui parte de um outro conteúdo protegido pela lei.

GAFA (Google, Apple, Facebook e Amazon) - AFP PHOTO / Damien MEYER

Segundo Mariana Valente, diretora geral do InternetLab, a proibição pode ir além de uma disputa entre empresas, afetando diretamente a liberdade de expressão dos cidadãos. "O processo de verificação automatizado é muito ineficiente e muitos produtores de conteúdo (na internet) podem ser lesados com isso "

Para entrar em vigor, a nova lei precisará ainda do aval de membros da Comissão Europeia e do Conselho da União Europeia, que já se mostraram favoráveis às mudanças. Caso a lei seja aprovada, é provável que cada país ganhe alguns meses para se adequar às novas exigências da lei.

No Brasil

Especialistas ouvidos pelo ‘Estado’ acreditam que a nova legislação sobre direitos autorais da União Europeia pode reanimar a discussão sobre a atualização da lei brasileira, que é de 1998.

"A nossa lei de direitos autorais está desatualizada porque não foi preparada para a era digital", diz Eduardo Magrani, coordenador da área de Direito e Tecnologia do ITS-Rio.

Outro fator que eleva a expectativa do debate é o fato de o Brasil costumar replicar as mudanças europeias. "Nossa lei do setor foi inspirada na legislação europeia", diz Mariana Valente, diretora do InternetLab. "É natural que comecemos a debater aqui."

Esta não seria a primeira vez que o Brasil se espelha na legislação europeia para se atualizar. Válida desde o começo do ano, a lei de proteção de dados pessoais da União Europeia foi fonte de inspiração da Lei Geral de Proteção de Dados, sancionada em agosto por Michel Temer. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.