O que se sabe sobre o 'Petro', moeda virtual anunciada por Maduro?

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 06/12/2017 às 11:58
Presidente venezuelano Nicolas Maduro inspeciona um dos computadores que será usado para gerar a criptomoeda Petro. AFP PHOTO / Venezuelan Presidency / Handout
Presidente venezuelano Nicolas Maduro inspeciona um dos computadores que será usado para gerar a criptomoeda Petro. AFP PHOTO / Venezuelan Presidency / Handout FOTO: Presidente venezuelano Nicolas Maduro inspeciona um dos computadores que será usado para gerar a criptomoeda Petro. AFP PHOTO / Venezuelan Presidency / Handout

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, anunciou a criação do "Petro", moeda virtual que será respaldada pelas reservas petroleiras, mas especialistas duvidam de seu sucesso por causa da desconfiança acerca do país.

- Qual é o objetivo? -

Ao lançar a iniciativa, neste domingo, Maduro disse que a criptomoeda vai permitir "avançar para novas formas de financiamento" para enfrentar as sanções dos Estados Unidos. Essas medidas proíbem os cidadãos e as empresas americanos de negociar títulos da Venezuela e de sua petroleira PDVSA. Neste contexto, o presidente venezuelano busca renegociar a dívida externa do país, de cerca de 150 bilhões de dólares.

De acordo com o governo, as sanções geraram atrasos no pagamento de capital e de juros desses títulos e afetaram as importações, das quais o país com as maiores reservas de petróleo do mundo depende. Como resultado dos pagamentos atrasados, um grupo de credores e agências de classificação declarou a Venezuela e a PDVSA em moratória parcial.

O ministro de Comunicação, Jorge Rodríguez, disse que o "Petro" vai levar à troca de dinheiro e de bens "sem mediação de nenhuma instituição financeira". Contudo, economistas como Henkel García veem seu impacto como "um meio de alívio para gerar um sistema de pagamentos".

"Teria que ter uma ampla aceitação dos atores econômicos (...), e isso é muito difícil tanto para uma moeda tradicional, quanto para uma digital", disse Garcia à AFP.

- Vai ser bem-sucedido? -

Especialistas consideram que as profundas distorções políticas e econômicas do governo dificultam a confiança no "Petro". O enorme gasto fiscal e uma inflação projetada pelo FMI em mais de 2.300% em 2018, somados à moratória, geram incertezas. A petromoeda, opinam, deveria ser acompanhada de um plano de reformas econômicas.

"Se se concretizar, o que eu duvido, seria a primeira moeda virtual emitida por um Banco Central, e não qualquer Banco Central, mas um que provocou uma hiperinflação", opinou à AFP Jean Paul Leidenz, especialista em moedas virtuais. "Teoricamente", aponta Garcia, "com as criptomoedas, poderia-se escapar do sistema financeiro americano (...), mas tudo depende de gerar confiança".

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José Ángel Álvarez, diretor da incipiente Associação Nacional de Criptomoedas (Asonacrip) e parceiro do governo na criação do "Petro", acredita que as reservas de petróleo e gás da Venezuela, bem como suas jazidas de ouro e diamante, oferecem garantias. "Que confiança maior pode existir que o maior recurso não renovável que existe no planeta, o petróleo?" - indagou Álvarez. Ele disse à AFP esperar que o "Petro" possa desbancar as criptomoedas de maior valor no mundo, o bitcoin e o ethereum. "O bolívar também está respaldado pelas reservas petroleiras e não tem força", confrontou García.

"As moedas virtuais não precisam de ativos de respaldo. Sua credibilidade se baseia na credibilidade das transações", apontou Leidenz. A chave é o "blockchain", uma base de dados que registra as transações de compra e venda de criptomoedas, acrescentou.

- Quando será lançado? -

O governo ainda não estabeleceu datas. "Nós não podemos nos limitar apenas aos prazos (...). Falar especificamente sobre um momento seria um exagero" diante da dimensão do objetivo, afirmou Álvarez. García pensa que "tudo está muito cru".

- Qual valor teria? -

Rei das moedas digitais, o bitcoin chegou a valer, na semana passada, 11 mil dólares. Não há estimativas sobre a cotação que o "Petro" poderia ter, mas Álvarez é otimista.

Citando como exemplo as cotação do bitcoin, o porta-voz da Asonacrip ressalta que as criptomoedas tiveram "altas e baixas, mas uma única tendência", à alta. Para Leidenz, o lógico seria estabelecer "uma taxa flutuante", diferentemente das cotações oficiais fixas que supervalorizam o bolívar em até 10.000 vezes frente ao dólar no mercado negro.

Se o "Petro" for supervalorizado, acrescenta, as distorções cambiárias com forte especulação vão se repetir.

- Há antecedentes? -

A China e a Rússia - aliadas de Maduro - estudam a viabilidade de criar um "cryptoiuan" e "cryptorublo", mas por ora são apenas projetos, destaca Leidenz.

O Japão e seu Banco Central têm planos de lançar a "J-Coin", de olho nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020, segundo o Financial Times.