Netflix e o mistério do algoritmo

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 10/08/2016 às 8:02
stranger things - netflix FOTO:

Inicialmente, o objetivo da Netflix ao analisar dados dos usuários era melhorar indicações de filmes e programas de TV na página principal. Hoje, no entanto, há grandes chances de que o conteúdo original do serviço de streaming seja produzido justamente com base nas informações colhidas pelo algoritmo. São referências que já podem determinar escolhas como tema, elenco e direção de cada uma das novas produções.

Lançada em fevereiro de 2013, House of Cards é exemplo claro disso. A partir do comportamento dos usuários, a Netflix foi capaz de perceber que os filmes estrelados por Kevin Spacey (intérprete de Frank Underwood) ou dirigidos por David Fincher eram alguns dos mais assistidos. Foi daí que nasceu a adaptação norte-americana de uma série homônima que já existia no Reino Unido e também era popular no catálogo.

Foto: Divulgação Escolha de Kevin Spacey para o papel de Frank Underwood teria sido baseada nos dados coletados pelo algoritmo. Foto: Divulgação

Com o último lançamento, Stranger Things, a empresa parece ter chegado ao nível máximo da manipulação dessas informações. Para Gustavo Miller, Gerente de Mídias Digitais da Red Bull e professor da ESPM, a história do sumiço de um garoto com referências a clássicos da década de 80 é a "maior obra prima do algoritmo da Netflix".

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"Desta vez temos uma série que costurou ET com Conta Comigo, Alien com Carrie, Contatos Imediatos do Terceiro Grau com Evil Dead, Goonies com Poltergeist. Tudo isso estrelado por dois dos atores mais populares da década perdida: Winona Ryder e Matthew Modine", escreveu Miller em artigo publicado na internet.

Em resposta aos questionamentos relacionados ao algoritmo, inclusive os da reportagem do JC, a Netflix é vaga. Só afirma que, "por ser uma empresa de capital aberto, não divulga nenhum número ou dado dos algoritmos". Segue, ainda assim, fornecendo ao público conteúdo personalizado, em uma estratégia, há de se admitir, brilhante. Principalmente se levado em consideração o fato de que em um ano, o streaming passou de 34 a 54 indicações ao Emmy Awards, principal prêmio da TV americana.

"Eles (da Netflix) têm a política de não divulgar detalhes sobre essa coleta de informações, mas não é nenhum segredo. Sabe-se que eles têm uma base mundial do que as pessoas estão consumindo, então aproveitam a segmentação do algoritmo. Agora eles sabem exatamente as preferências de cada um dos usuários e são tantos dados que conseguem fornecer conteúdos específicos", explica Mariane Firmino, líder da unidade da IBM Commerce no Brasil.

Mariane Firmino, da IBM. Foto: Divulgação Mariane Firmino, da IBM. Foto: Divulgação

É importante, ainda, notar como essa cultura algorítmica tem impactado o usuário, de modo que produza nele novos hábitos de pensamento e conduta. "Sem sombra de dúvidas a gente deve assistir uma mudança breve de comportamento não só de consumo, mas também de outras questões comportamentais. Por exemplo, quais serão as carreiras do futuro baseadas nisso?", questiona Mariane.

Feito ou não o uso da estratégia, sabe-se que a Netflix acertou a fórmula ao criar Stranger Things. A série tornou-se a mais popular do IMDb, base de dados de séries e filmes na internet, superando até Game of Thrones, que já tem seis anos de idolatria por parte do público. Além disso, a adoração demonstrada nas redes sociais nos últimos meses só reforça o quanto a tecnologia tem deixado pra trás as já obsoletas pesquisas de opinião em diversos setores.