Bolsonaro ganha, mas perde. Por Ricardo Leitão

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jamildo

Publicado em 28/01/2021 às 18:00
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Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog

Estimativas indicam que Arthur Lira (PP/AL) vencerá, nesta segunda-feira, dia 1º, a eleição para a presidência da Câmara de Deputados. Lira é um dos líderes do Centrão, aglomerado de centro-direita, conhecido por sua voracidade por verbas e cargos públicos. Tem o apoio de Jair Bolsonaro. Seu principal adversário é Baleia Rossi (MDB/SP), que conta com os votos dos partidos de oposição ao Presidente.

De acordo com as regras tradicionais da política, se Arthur Lira vencer, Jair Bolsonaro também ganha. No entanto, em Brasília, as contas são mais complexas. Na presidência da Câmara, é certo que Lira, de princípio, irá bloquear a abertura de processos de impeachment do Capitão (já são 58). Baleia Rossi faria o contrário. Mas, por outro, à frente da Câmara, Lira deve barrar a tramitação de projetos que não interessam à base bolsonarista de centro-direita, como as reformas tributária e administrativa.

As duas reformas, como se sabe, fizeram parte do programa de governo do candidato Bolsonaro e são agora reivindicadas publicamente por empresários, técnicos e a equipe do Ministério da Economia. Há quem relacione a mitigação da crise econômica à sua aprovação pelo Congresso. A vinculação também influenciaria o resultado das eleições presidenciais de 2022.

Cara ou coroa? Há entre os aliados de Sua Excelência a consciência de que um processo de impeachment deixou de ser uma palavra de ordem da oposição e começa a ganhar adeptos nos mais diferentes setores da opinião pública. Nenhuma liderança política ou institucional levantou a voz para se opor publicamente à retirada de Bolsonaro do Palácio do Planalto, por força de lei. Do contrário, os mais recalcitrantes opinam que a decisão virá, mas é necessário que os fatos amadureçam. Outros contestam: os fatos já amadureceram, o Brasil não aguenta mais o Capitão.

Por paradoxal que pareça, a tragédia humanitária resultante do combate do governo à pandemia assegura uma sobrevida a Bolsonaro. O debate político sobre o impeachment irá radicalizar e paralisar o país, em meio a milhões de infectados e milhões de mortos pela covid-19. O efeito mais grave seria uma convulsão social, estimulando as vivandeiras a bater às portas dos quartéis.

Portanto, são sombrias as perspectivas, com Baleia Rossi ou Arthur Lira na direção da Câmara. Na verdade, qualquer perspectiva se torna sombria quando envolve esse presidente da República.

Ainda assim, é importante lembrar: Jair Bolsonaro foi eleito com 57 milhões de votos, em uma eleição sem fraudes. Sua popularidade está em queda, mas ele ainda conta com o apoio de um terço da população, o que o transforma em um candidato competitivo na disputa presidencial de 2022. O problema é o seu governo desastroso no varejo e no atacado, marcado por escândalos, como a multidão de quase 14 milhões de desempregados.

Desde o fim da ditadura, todos os presidentes eleitos pelo voto direto enfrentaram ameaças de impeachment: Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e, agora, Bolsonaro. Entre os anteriores ao Capitão, só dois – Collor e Dilma – perderam os seus mandatos ao fim dos julgamentos políticos. Os dois tinham a mesma fragilidade: uma péssima relação com o Congresso.

É a mesma fragilidade que pode corroer o Capitão. Ele se mobiliza para fechar o flanco, contando principalmente com a fidelidade do Centrão. Para essa base esperta e pragmática, acena com a liberação de recursos de emendas parlamentares e cargos até do primeiro escalão. Uma manobra semelhante à realizada por Dilma Rousseff, quando buscou o apoio da direita para preservar o seu mandato. Deu no que deu.

As raposas mais felpudas de Brasília alertam para o caráter (ou a falta dele) dessa gelatinosa base, à qual tenta se amoldar o Presidente da República. Não há nenhuma certeza de que, vitorioso, o Centrão irá cumprir os seus compromissos com Bolsonaro se o barco do Capitão começar a fazer água. Antes que afundem, Arthur Lira e os seus saltarão fora e se agarrarão à boia mais próxima. Sua Excelência ficaria então se debatendo em águas turvas e encapeladas.

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