Fio de cabelo ajuda a decifrar enigmas relacionados ao zika; saiba como

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 27/08/2018 às 15:50
Fio de cabelo é coletado de participantes da pesquisa que apresentam sintomas de zika, chicungunha ou dengue durante (ou nos últimos 30 dias) as entrevistas para o inquérito (Foto: Reprodução/Internet)
Fio de cabelo é coletado de participantes da pesquisa que apresentam sintomas de zika, chicungunha ou dengue durante (ou nos últimos 30 dias) as entrevistas para o inquérito (Foto: Reprodução/Internet) FOTO: Fio de cabelo é coletado de participantes da pesquisa que apresentam sintomas de zika, chicungunha ou dengue durante (ou nos últimos 30 dias) as entrevistas para o inquérito (Foto: Reprodução/Internet)

Entre as mulheres infectadas pelo zika na gestação, ainda é preciso saber: qual a intensidade da doença entre aquelas de baixa condição socioeconômica e as de maior renda? “Se, em ambos os grupos, não houver diferença no grau de exposição ao vírus, questionaremos: por que uma minoria de casos de microcefalia foi verificada entre mulheres de classe média alta?”, diz o pesquisador Ernesto Marques Júnior, da equipe do Inquérito de Arboviroses do Recife, da Fiocruz Pernambuco. A resposta pode estar num fio de cabelo, coletado de participantes que apresentam sintomas de zika, chicungunha ou dengue nos últimos 30 dias ou durante as entrevistas para o inquérito.

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“O fio de cabelo pode mostrar biomarcadores relacionados a substâncias tóxicas e outros indicadores capazes de alterar ou diminuir a imunidade da placenta (que ficaria mais sensível ao ataque do zika)", acrescenta Ernesto, do Departamento de Virologia e Terapia Experimental (Lavite).

Em Pernambuco, desde 2015, houve 2.555 notificações de zika congênita. Dessas, 456 foram confirmadas e 215 permanecem em investigação. Com testes mais específicos, como o do fio de cabelo, o inquérito esclarecerá como fatores ambientais interagem com o vírus e podem (ou não) contribuir para a explosão dos casos de microcefalia.

Inquérito de Arboviroses do Recife vai traçar um panorama inédito dos casos novos e antigos, em diferentes níveis socioeconômicos e faixas etárias, das três doenças transmitidas pelo Aedes aegypti (Foto: Diego Nigro/JC Imagem)

Entenda o Inquérito de Arboviroses do Recife

Visitas de porta em porta, a cerca de 1,5 mil residências em 43 dos 94 bairros do Recife, começaram a fazer parte da rotina de pesquisadores da Fiocruz Pernambuco, que abraçaram a missão de fazer o primeiro retrato fiel das arboviroses (zika, chicungunha e dengue) na capital pernambucana. O mapeamento, intitulado de Inquérito de Arboviroses do Recife, vai traçar um panorama inédito dos casos novos e antigos, em diferentes níveis socioeconômicos e faixas etárias, das três doenças transmitidas pelo Aedes aegypti – mosquito por trás da tríplice epidemia enfrentada pelo Estado em 2015 e 2016, de forma desenfreada. Com um custo aproximado de R$ 3 milhões, o estudo tem aporte financeiro da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), do Ministério da Saúde e do consórcio internacional Zikalliance.

“A partir desse levantamento, vamos ter uma ideia mais precisa da dimensão das epidemias de zika e chicungunha e avaliar como está a situação da dengue na cidade. Vamos entrevistar as pessoas para conhecer a história anterior de adoecimento. Também coletaremos amostra de sangue em quem não apresentar sintomas de arboviroses no momento da visita”, explica a pesquisadora da Fiocruz Pernambuco Cynthia Braga, coordenadora do inquérito. Já os participantes que tiverem sinal de alguma das doenças, durante a entrevista (ou nos últimos 30 dias), serão submetidos a testes de saliva, urina e fio de cabelo para um diagnóstico confiável.

As visitas às residências acontecem, de segunda a quinta, das 17h às 21h. Aos sábados, das 9h às 12h (Foto: Diego Nigro/JC Imagem)

Com testes mais específicos, os pesquisadores tentam esclarecer se fatores ambientais podem ter interagido com o zika e ter contribuído com a explosão dos casos de microcefalia, que se tornou a malformação congênita mais associada ao vírus. “A maioria dos casos de síndrome congênita do zika ocorreu na fatia da população de baixa condição socioeconômica. Uma minoria foi verificada entre mulheres de classe média alta. Mas ainda não está claro se elas se infectarem menos ou se possuem algum outro cofator ambiental associado”, ressalta o pesquisador Ernesto Marques Júnior, integrante da equipe técnica do inquérito.

O material coletado, durante as visitas às residências, será encaminhado ao Departamento de Virologia e Terapia Experimental da Fiocruz Pernambuco, onde serão feitas análises. “Para cada amostra de sangue, serão rastreadas as três arboviroses. Vamos ver quem já teve as doenças ou não. Os resultados revelarão o número de pessoas que foram infectadas e como as arboviroses, especialmente zika e chicungunha, distribuíram-se e circularam na cidade”, diz Cynthia. Ela acrescenta que o levantamento será capaz de identificar os segmentos da população recifense mais vulneráveis a arboviroses, de acordo com o sexo, faixa etária e condição socioeconômica.

Também integrante da equipe do inquérito, a pesquisadora Fátima Militão acentua que, entre os diferenciais desse mapeamento, está o de identificar a proporção de pessoas susceptíveis ao adoecimento. São aquelas que nunca tiveram zika, chicungunha e/ou dengue. “É um grupo que não desenvolveu imunidade e, na presença de uma nova epidemia, pode ser infectado. A partir desse estudo, saberemos quem é essa população. Essa é uma resposta que ainda não temos em cidade alguma do Brasil”, salienta.

As visitas serão, de segunda a quinta, das 17h às 21h. Aos sábados, das 9h às 12h. A previsão é de que a pesquisa, nas residências, seja finalizada em dezembro. Após um ano, o estudo deve ser concluído, com resultados apresentados a gestores, comunidade acadêmica e população em geral.