O peso da depressão no risco de suicídio: 44% dos recifenses com o transtorno já pensaram em morrer

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 23/09/2017 às 12:04
Entre os participantes da pesquisa que tiveram depressão, 34% não procuraram ajuda médica para cuidar do transtorno. É um percentual alto e que preocupa porque, sem apoio especializado, quem tem depressão permanece em risco de tirar a própria vida (Foto: Pixabay)
Entre os participantes da pesquisa que tiveram depressão, 34% não procuraram ajuda médica para cuidar do transtorno. É um percentual alto e que preocupa porque, sem apoio especializado, quem tem depressão permanece em risco de tirar a própria vida (Foto: Pixabay) FOTO: Entre os participantes da pesquisa que tiveram depressão, 34% não procuraram ajuda médica para cuidar do transtorno. É um percentual alto e que preocupa porque, sem apoio especializado, quem tem depressão permanece em risco de tirar a própria vida (Foto: Pixabay)

A mensagem principal do Setembro Amarelo é disseminar para a população que cerca de 90% dos casos de suicídio podem ser prevenidos quando os transtornos psiquiátricos, como a depressão, são tratados. Sem acompanhamento médico adequado, esses casos se tornam graves, intensificam o sofrimento e o comportamento suicida. Entre os recifenses que já vivenciaram a depressão, por exemplo, 44% já pensaram em suicídio, o que reforça como esse distúrbio mental está bastante associado a pensamentos frequentes de morte.

Clique aqui e confira o que o Casa Saudável já publicou sobre prevenção ao suicídio

A informação é um dos destaques apresentados pelo levantamento Hábitos e Cuidados com a Saúde do Recifense, realizado pelo Instituto de Pesquisas Uninassau com 624 pessoas a partir dos 16 anos. As entrevistas, feitas nos dias 11 e 12 deste mês, contemplaram também aspectos e atitudes relacionados à saúde mental, como forma de destacar o Setembro Amarelo.

“Suicídio é um problema de saúde pública que precisa ser, cada vez mais, discutido. Por isso, o tema foi parte da pesquisa”, informa o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Adriano Oliveira, que é um dos coordenadores do levantamento.

Especialistas não têm dúvida de que essa missão de informar corretamente sobre a prevenção dos casos é um caminho valioso para conscientizar a população sobre a necessidade de procurar tratamento para os transtornos psiquiátricos. Entre os participantes da pesquisa que tiveram depressão, a maioria (66%) foi ao médico para cuidar do distúrbio. Mas outros 34% não procuraram ajuda nos consultórios. É um percentual alto e que preocupa porque, sem apoio especializado, quem tem depressão permanece em risco de tirar a própria vida.

Conhecer para prevenir

“As pessoas precisam compreender que não estão sozinhas e que o quadro de sofrimento mental intenso pode ser tratado. Falar e agir em torno disso são fundamentais porque ajudam a sociedade a procurar profissionais de saúde capazes de identificar e tratar (o transtorno mental) de forma adequada”, reforçou o psiquiatra Rodrigo Silva, do Hospital das Clínicas da UFPE.

"Usar o laço amarelo sinaliza envolvimento com a prevenção ao suicídio. Mas fomos além: falamos mais sobre o tema, e as pessoas vão apreendendo que o sofrimento emocional tem tratamento", frisa o psiquiatra Rodrigo Silva, do HC/UFPE (Foto: Guga Matos/JC Imagem)

Na sexta-feira (22), o médico participou do programa Casa Saudável, na TV JC, e chamou a atenção para os casos de tentativas de suicídio entre os idosos. É na faixa etária acima dos 70 anos, segundo o Ministério da Saúde, que se concentra a maior taxa de suicídio: 8,9 mortes (maior do que a média nacional, de 5,5) por 100 mil habitantes nos últimos seis anos.

No levantamento do Instituto Uninassau, o recorte para o grupo a partir dos 60 anos também acende um alerta: entre os idosos entrevistados, 63% pensaram em suicídio quando estavam em depressão. O índice é maior do que o total (44%) e só reforça o quanto o sofrimento mental merece ser tratado em todas as fases da vida.

Transtornos psiquiátricos e suicídio

Especialistas em saúde mental disseminam uma mensagem educativa: o diagnóstico precoce e o tratamento correto dos distúrbios mentais são caminhos que impactam diretamente na redução dos óbitos por suicídio.

“Há uma relação muito próxima entre transtornos psiquiátricos e suicídio. A maioria das pessoas que cometeu o ato, cerca de 95%, apresentava uma condição que afeta a saúde mental (distúrbios de humor e esquizofrenia, por exemplo). São transtornos que aumentam muito o risco de tentativas. Mas é bom reforçar que muitos dos que apresentam algum problema nem vão tentar”, explica o psiquiatra Leonardo Machado, secretário da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria (SPP).

"Quem está em risco (de tirar a própria vida) quer sentir que pode falar sem ser censurado", diz o psiquiatra Leonardo Machado (Foto: Luisi Marques/JC Imagem)

O depoimento do médico traz luz ao problema: os casos de suicídio podem e devem ser prevenidos. Para isso, é fundamental levantar uma bandeira que desmistifica os transtornos mentais, especialmente numa época em que, no Brasil, a prevalência de depressão (associada ao comportamento suicida) ultrapassa a taxa média mundial, de 4,4%. No País, o índice é de 5,8%, segundo a Organização Mundial de Saúde. Infelizmente, os transtornos mentais nem sempre são diagnosticados e, dessa maneira, perde-se a chance de oferecer tratamento e apoio emocional a quem precisa.

É justamente essa lacuna que mantém o aumento constante de pessoas no grupo de risco para o suicídio. Em Pernambuco, o número de tentativas de suicídio saiu, em 2015, de 475 para 623 em 2016. Os dados (subnotificados, estimam os especialistas) são da Secretaria Estadual de Saúde.

Vários fatores podem ter contribuído com essa expansão dos casos e tentativas de suicídio, incluindo o desemprego, prejudicial à saúde mental por alimentar o estresse e a sensação de insegurança. “Não podemos ficar em silêncio. Deixar de falar sobre suicídio não é a melhor estratégia. Se fosse, o número de casos teria diminuído”, reforça Leonardo Machado, que aposta na máxima de que a troca de informações sobre o tema não provoca danos à população. Muito pelo contrário: trazer à tona o debate de forma correta e sem sensacionalismo é uma estratégia que pode ser acolhedora para os grupos de risco.

"A campanha passou a 'andar' por si só. Este ano houve engajamento dos adolescentes e, em 2018, vamos estar mais perto das escolas", destaca o psiquiatra Antônio Geraldo da Silva, coordenador nacional do Setembro Amarelo (Foto: Bobby Fabisak/JC Imagem)