Mais que um recurso terapêutico, a ioga é um carinho na alma

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 04/05/2017 às 8:00
Conjunto de conhecimentos indianos milenar, a ioga trabalha o corpo e a mente através de técnicas de respiração, posturas e meditação (Foto: Felipe Ribeiro / Acervo JC Imagem)
Conjunto de conhecimentos indianos milenar, a ioga trabalha o corpo e a mente através de técnicas de respiração, posturas e meditação (Foto: Felipe Ribeiro / Acervo JC Imagem) FOTO: Conjunto de conhecimentos indianos milenar, a ioga trabalha o corpo e a mente através de técnicas de respiração, posturas e meditação (Foto: Felipe Ribeiro / Acervo JC Imagem)

Imagina poder dar um abraço na alma, certamente aflita pelo estresse diário? Ou dar um pouco de carinho ao seu corpo, tantas vezes castigado pelas demandas do cotidiano? Em uma sociedade que exige cada vez mais que desempenhemos múltiplos papéis, encontrar atividades que nos tragam paz é desafiador. Talvez por isso que práticas até pouco tempo negligenciadas pelo mundo ocidental, a exemplo da meditação, venham despertando a curiosidade de muitas pessoas. Uma delas é a ioga.

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Se engana quem pensa que a prática se resume apenas a posturas mirabolantes. Nada disso. Ioga - que em sânscrito significa 'unir' ou 'integrar' - poderia ser definida como um estilo de vida. Isso mesmo. Um conjunto de conhecimentos indianos que passa por gerações há mais de cinco mil anos. São inúmeras lições físicas e mentais aplicadas no dia a dia. "De uma forma prática, ioga é quando estamos presentes. Quando nossa respiração, corpo e mente estão totalmente alinhados com o que quer que se esteja fazendo. Aqui no ocidente, a palavra está muito relacionada às posturas, que são apenas uma parte do que é ioga. Para alcançar esse estado de presença, existem alguns caminhos e um deles são as posturas", explica a designer e instrutora de ioga Caroline Godoy.

Além das posturas (ásanas), a prática se baseia nos benefícios das técnicas de respiração (pranayamas) e métodos de meditação. Um tripé em busca da harmonia entre corpo, alma e mente. "Um dos papéis das posturas é acalmar o corpo para o propósito final da prática, que é a meditação. Os ásanas também estão muito relacionados aos nossos órgãos, trazendo inúmeros benefícios físicos. E tanto as posturas como a respiração têm o poder de trazer a mente para o momento presente", pontua Caroline, que há quase dez anos decidiu se aprofundar nos ensinamentos da ioga. A instrutora já fez treinamentos no Brasil e na Índia. Atualmente se dedica ao voluntariado das práticas na sede recifense da entidade internacional Arte de Viver, fundada pelo líder espiritual Sri Sri Ravi Shankar.

Imagem da designer e instrutora de ioga Caroline Godoy (Foto: Acervo pessoal) "Não tem como curar a população mundial apenas com prozac. A ioga, definitivamente, é uma possibilidade para a cura das doenças da modernidade", pontua a instrutora Caroline Godoy (Foto: Acervo pessoal)

Agora que você já sabe que ioga é muito mais do que colocar o pé na cabeça, deve estar ponderando alguns empecilhos. Alguns podem dizer que não são flexíveis o bastante. Outros apontarão a idade avançada como principal obstáculo. Tem até quem diz que não é calmo o suficiente para se desligar do mundo lá fora. "Na verdade, todos nós já nascemos yoggies. Se olharmos para as crianças, por exemplo, perceberemos que elas estão totalmente presentes em suas atividades. Mas com o tempo, recebemos tantos estímulos que os órgãos dos sentidos se dispersam e nós esquecemos de voltar para esse cantinho que é tão nosso. A boa notícia é que todo mundo pode praticar ioga. Não se trata de uma prática apenas para os magros, flexíveis ou pacientes. Não existem limitações, apenas familiaridade com diferentes técnicas", ressalta.

Não sabe como começar? Sem pressa. Pode iniciar aos poucos. Os benefícios, defendem os especialistas, serão notados em diferentes esferas de sua vida. "Tire um momento do dia para sentar e se conectar consigo. Sem leitura, sem música, sem telefone. Apenas ouvindo sua respiração e os batimentos do seu coração. Nesse mundo tem tanta coisa que nos afasta de nós, mas, se sentarmos por cinco minutos e honrarmos nosso corpo, começaremos a perceber que tudo que precisamos já está dentro de nós. Estamos tão acostumados a fazer nossa higiene física diariamente. Mas o que temos feito para cuidar das nossas emoções?", defende a instrutora. Em tempo: a Arte de Viver realizará no dia 18 de junho o Yoga Day 2017, em comemoração ao Dia Internacional da Ioga. A programação gratuita acontecerá na Praça da Preguiça, em Olinda, no Grande Recife.

Para os especialistas em saúde mental, essas práticas podem servir como importantes aliados na melhora da qualidade de vida de pacientes que convivem com distúrbios diversos, a exemplo da depressão e do transtorno de ansiedade generalizada (TAG). "São técnicas que funcionam como excelentes recursos de apoio para a melhoria da qualidade de vida. Alguns estudos apontam, inclusive, que a meditação, se praticada de forma sistemática, pode levar à alteração de estruturas cerebrais relacionadas à ansiedade e à depressão", pontua a psiquiatra Kátia Petribú, presidente da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria (SPP).

Imagem da psiquiatra Kátia Petribú (Foto: Tato Rocha / Acervo JC Imagem) "Essas práticas deveriam existir em mais lugares no Brasil, como em escolas e hospitais. São recursos terapêuticos que ajudam as pessoas a lidar com a correria que é a vida moderna", defende a psiquiatra Kátia Petribú (Foto: Tato Rocha / Acervo JC Imagem)

As técnicas, segundo a especialista, têm sido usadas em diversos países já nos primeiros anos de vida da população. "Na Inglaterra, alguns projetos de meditação nas escolas mostram que as crianças que se submetem a essas práticas têm muito mais resiliência para lidar com situações adversas e demandas da vida diária. Nos países desenvolvidos, vem sendo um caminho promissor no tratamento de muitas doenças", conta Petribú.

Vale reforçar, no entanto, que é preciso ter disciplina para colher os frutos. "Deve ser muito mais uma mudança no estilo de vida do que uma atividade esporádica. A prática precisa ser sistemática para surtir o efeito terapêutico desejado", defende a especialista.

Rede pública de saúde

Em 2006, devido ao crescimento na procura o Sistema Único de Saúde (SUS) por tratamentos terapêuticos alternativos, além de recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Ministério da Saúde (MS) criou a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PICs). Inicialmente o plano contemplava as áreas de homeopatia, fitoterapia, medicina tradicional chinesa (acupuntura), medicina antroposófica e termalismo social (crenoterapia). Em janeiro deste ano, a decisão do Ministério da Saúde de incluir sete novos tratamento no âmbito do PICs virou notícia. São eles: arteterapia, meditação, musicoterapia, naturopatia, osteopatia, quiropraxia e reiki. Na prática, atualmente são 19 práticas integrativas e complementares à população.

Além das inclusões, foram também renomeados procedimentos já inclusos no rol da Política. O objetivo foi facilitar a identificação, pelos gestores, dos procedimentos nos sistemas de informação do SUS. As novas nomenclaturas são para terapia comunitária, dança circular/biodança, ioga, oficina de massagem/automassagem, sessão de auriculoterapia, sessão de massoterapia, e tratamento termal/crenoterápico. Isso quer dizer que tais práticas já existiam no SUS, mas atendiam a nomes diferentes ou estavam englobadas nos cinco primeiros tratamentos alternativos oferecidos na rede pública de saúde.

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Em 2016, mais de 2 milhões de atendimentos das PICs foram realizados nas Unidades Básicas de Saúde de todo o país, sendo 770 mil de medicina tradicional chinesa, incluindo acupuntura, 85 mil de fitoterapia, 13 mil de homeopatia e 923 mil de outras práticas integrativas que ainda não possuíam código próprio para registro e que passaram a fazer parte do rol no início do ano. Atualmente, segundo últimos dados do Ministério da Saúde, 1.708 municípios oferecem práticas integrativas e complementares e a distribuição dos serviços está concentrada em 78% na atenção básica, principal porta de entrada do SUS, 18% na atenção especializada e 4% na atenção hospitalar. Mais de 7.700 estabelecimentos de saúde ofertam alguma prática integrativa e complementar.

Os recursos para as PICS integram o Piso da Atenção Básica (PAB) de cada município, podendo o gestor local aplicá-los de acordo com sua prioridade. Em 2016, o investimento do Ministério da Saúde na Atenção Básica foi de R$ 16,7 bilhões para todo o país. Estados e municípios também podem instituir sua própria política, considerando suas necessidades locais, sua rede e processos de trabalho.

No Recife, o Núcleo de Apoio em Práticas Integrativas (NAPI) funciona de maneira conjunta com o Núcleo de Apoio à Saúde da Família para promover as atividades diferenciadas aos usuários da rede de saúde da capital pernambucana. As equipes do NAPI estão espalhadas nos oito Distritos Sanitários e ampliam o cuidado à atenção básica por meio do matriciamento do território, método em que os profissionais de saúde compartilham os seus conhecimentos. As equipes têm como objetivo promover o autocuidado, o bem-estar e a longevidade do paciente por meio da medicina complementar.

O acesso às unidades se dá através de encaminhamento da rede SUS ou de forma espontânea. Atualmente, duas unidades atendem a população do Recife, as duas especializadas em diversas práticas de cuidado. Para atender aos distritos sanitários I, II e III, a referência é a Unidade de Cuidados Integrais em Saúde Professor Guilherme Abath, na Encruzilhada, Zona Norte da cidade. E para atender aos distritos sanitários IV, V e VI, a referência é o Centro Integrado de Saúde, no bairro do Engenho do Meio, Zona Oeste.

Enquanto a primeira oferece tratamentos da medicina tradicional chinesa, oficinas abertas ao público (como a automassagem, oficinas de alimentação saudável e de dança circular) e programações culturais, o Centro Integrado de Saúde acolhe cinco usuários por dia e cada um recebe um projeto terapêutico, em que é encaminhado para as práticas ofertadas pela unidade. Hoje, o Centro dispõe de tipos de atendimentos diferenciados: grupos de prática, terapias individuais, programa terapêutico, além de cursos com o objetivo de que a comunidade adote uma vida mais saudável.

Serviço

Unidade de Cuidados Integrais em Saúde Professor Guilherme Abath

Endereço: Rua Marechal Deodoro, 235, Encruzilhada, Recife

Telefone: (81) 3355.6142

Centro Integrado de Saúde

Endereço: Rua Lindolfo Color, 65, Engenho do Meio, Recife

Telefone: (81) 3355.6142

Yoga Day - programação gratuita marca o Dia Internacional da Ioga

Data: 18 de junho

Horário: 6h às 17h

Local: Praça da Preguiça (Praça da Abolição), Rua do Bonfim, Olinda