Nunca é em vão reacender o debate sobre doenças pneumocócicas

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 27/10/2010 às 0:48

Jornalismo tem destas coisas: numa entrevista com uma superfonte ou um personagem carismático, o repórter se deixa cativar tanto que faz do bate-papo um momento inesquecível. A matéria é publicada, o tempo passa e o jornalista até pode deixar um pouco de lado o envolvimento com a história, mas a memória sempre guarda relatos marcantes. Por vezes, essas histórias que conquistam a atenção da gente ressurgem na nossa mente por um motivo qualquer.

Foi o que aconteceu comigo nesta semana, quando arrumava minhas estantes e dei de cara com uns rabiscos antigos, frutos de uma apuração sobre doenças pneumocócicas, que causam até 1,6 milhão de óbitos a cada ano nos quatro cantos do planeta. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), até um milhão dessas mortes é de crianças com menos de cinco anos. Como pode a bactéria pneumococo ser tão fatal, né?!?

Ah, nesse ponto, vale informar quais são as enfermidades que fazem parte desse grupo. São elas: a doença pneumocócica invasiva (inclui sepse e bacteremia - infecção da corrente sanguínea), meningite (inflamação da membrana que cobre o cérebro e a medula espinhal), pneumonia bacterêmica e empiema (acúmulo de pus na cavidade em torno dos pulmões), como também a doença pneumocócica não invasiva, como pneumonia e otite média aguda.

Fico entristecida só de pensar que esse conjunto de problemas graves pode se manifestar, nas crianças, por causa da falta de imunização contra esse micro-organismo. Ao olhar as folhas do meu bloquinho velho, revi os esboços que fiz enquanto entrevistava a mãe de uma garotinha de dois anos. A menina estava na enfermaria pediátrica do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), aqui em Pernambuco.

Lembrei que o estado dela não era bom no dia em que visitei o hospital. O motivo? Ela havia desenvolvido a pneumonia bacterêmica e estava em tratamento. Os médicos ainda não sabiam com exatidão os problemas que ela poderia enfrentar no futuro por causa das possíveis sequelas deixadas pela doença. Isso foi o que eu soube da menina. Depois, não tive mais notícias dela. E por não ter conhecimento do prognóstico, fiquei pensando na condição em que ela pode estar hoje... Espero que, dentro do possível, esteja bem.

Imaginei que todo o sofrimento enfrentado pela garota e pela família era evitável. Bastava ter tomado corretamente todas as doses da vacina pneumocócica conjugada, que ainda não estava disponível na rede pública na época em que entrevistei a mãe da garota, há um ano e meio. Pois é, a imunização é a forma segura que as crianças têm para fecharem o cerco contra o pneumococo e terem mais chances de desfrutar uma infância saudável.

OPÇÕES  - No começo deste ano, passou a fazer parte do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde uma vacina pneumocócica conjugada: a 10-valente (ou Synflorix), da farmacêutica GlaxoSmithKline (GSK). O Brasil foi o primeiro país a incluí-la na política nacional de saúde pública.

Mais um gol de placa: a aprovação, no Brasil, da Prevenar 13 (ou 13-valente), que é um progresso da Prevenar 7 (ou 7-valente), a primeira vacina pneumocócica conjugada lançada em 2000 e que saiu do mercado para merecidamente dar lugar à sucessora. Foi a 7-valente responsável por engatar, em várias partes do mundo, um processo de mudança em relação à incidência e à mortalidade das doenças pneumocócicas. As crianças que receberam a Prevenar-7 criaram uma espécie de escudo no organismo contra o pneumococo.

A diferença da 13-valente para a 7-valente, ambas da farmacêutica Pfizer, é que a primeira traz seis bônus. Com essa vantagem, a Prevenar 13 contém todos os sorotipos que já havia na Prevenar 7 (4, 6B, 9V, 14, 18C, 19F e 23F) e mais outros seis (1, 3, 5, 6A, 7F e 19A). Nas clínicas privadas de vacinação, a transição de Prevenar 7 para Prevenar 13 em bebês e crianças foi totalmente concluída. Ou seja, todas já possuem no programa de vacinação a 13-valente, aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela agência que controla medicamentos nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), além de ser comercializada legalmente em outros países.

"Podemos afirmar com segurança que mais de 90% dos sorotipos que causam doenças pneumocócicas são cobertas pela Prevenar 13", disse o pediatra Juarez Cunha, membro do núcleo de pesquisa em vacinas do Hospital das Clínicas de Porto Alegre. Esse depoimento do médico foi dado durante o lançamento da 13-valente, no 10º Simpósio Brasileiro de Vacinas, realizado em Gramado (RS), em julho deste ano. 

Trata-se de uma declaração importante que se reflete numa cena positiva. Afinal, os pais desejam que seus rebentos tornem-se superimunes contra doenças que são as principais causas de morte em crianças menores de um ano. Outro detalhe que erroneamente algumas famílias imaginam é que as crianças com imunidade forte não possuem riscos de desenvolver doenças pneumocócicas. E ao terem esse pensamento como verdadeiro, acabam deixando a vacina pra depois. Mas olha só o alerta da médica Gail Rodgers, diretora de vacinas da Pfizer: "Aproximadamente 80% das crianças com alguma doença pneumocócica invasiva são previamente saudáveis". Esse esclarecimento também foi dado em julho, no lançamento da Prevenar 13.

Nesta semana, fiz um levantamento em clínicas particulares e soube que a dose dessa nova vacina pneumocócica conjugada custa cerca de R$ 260. A título de informação, a 13-valente deve ser administrada em quatro doses: aos dois, quatro, seis meses - e entre 12 e 15 meses. Crianças que receberam uma ou mais doses de Prevenar 7 podem completar o processo de imunização com Prevenar 13. E olha que legal: os pequenos com mais de 15 meses, que já foram imunizados com as quatro doses da antiga 7-valente, também podem receber uma dose adicional de Prevenar 13. Sabe por quê? Simplesmente para se obter resposta imune aos seis sorotipos adicionais da nova vacina.

Agora, para os pequenos que começaram o esquema com a 10-valente ou Synflorix, a orientação dos especialistas é que não dá para continuar o processo de imunização tomando as outras doses necessárias através da aplicação da 13-valente. A explicação: os levantamentos não demonstram compatibilidade entre a Synflorix e a Prevenar 13. Isso acontece porque elas não possuem a mesma proteína carreadora imunológica - uma peça fundamental nas vacinas conjugadas.

E é esse ponto que traz à tona discussões que merecem ser consideradas. Tanto a antiga 7-valente como a atual 13-valente possuem um carreador que já é usado há cerca de 20 anos em vacinas pediátricas. A questão é que a 10-valente tem um carreador novo e, por isso, há especialistas que não se sentem confortáveis com isso. De qualquer maneira, a GSK é firme ao alegar que o seu imunizante é bastante seguro, com base em levantamentos que comprovam eficácia e efetividade da 10-valente.

Ou seja: a decisão da escolha do tipo de vacina depende bastante da troca de ideias que a família deve ter com os neonatologistas e os pediatras. Uma conversa que, por sinal, precisa ser feita quando o bebê ainda está na barriga da mamãe. Nada de deixar esse bate-papo pra depois, combinado?!?

Saiba onde buscar mais informações sobre vacinação:

- Associação Brasileira de Imunização

- Sociedade Brasileira de Pediatria

- Ministério da Saúde

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- Doenças pneumocócicas

- Medos que encucam as mães