Escondidos em meio à multidão das arquibancadas e apoiados em uma legislação que prevê punições brandas para o crime de injúria racial, torcedores continuam proliferando esse tipo de comportamento em vários estádios mundo afora. A reincidência é tão frequente que aproximou, no último final de semana, três casos, um no futebol internacional, um no Campeonato Brasileiro e outro aqui em Pernambuco.
Taison e Dentinho, brasileiros que atuam no Shakhtar Donetsk, da Ucrânia, saíram de campo chorando após serem chamados de “macacos” em jogo do Campeonato Ucraniano, contra o Dínamo de Kiev. No clássico entre Atlético-MG e Cruzeiro, houve briga entre as torcidas e uma rádio local flagrou insultos de um homem a um segurança que tentava interceptar o conflito. “Olha a tua cor, olha a tua cor”, bradava o torcedor. O vigilante se chama Fábio Coutinho e prestou queixa. A Polícia Civil de Minas já identificou dois torcedores que teriam cometido a injúria racial e um inquérito foi aberto.
No futebol pernambucano, no Campeonato da categoria sub-20, o Sport deu amplitude e prestou solidariedade ao seu atleta Rafael da Costa, que foi alvo de insultos no jogo contra o Barreiros. “A gente se desestabiliza um pouco. Durante o jogo, eu me peguei pensando nisso por algum tempo, mas foi rápido, depois passou”, comentou o rubro-negro, que também fez o relato em seu perfil em uma rede social.
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Já Taison explodiu. Chutou a bola em direção às arquibancadas e fez gestos obscenos à torcida. Acabou expulso e saiu de campo aos prantos. Dentinho também foi às lágrimas com a situação. “Amo minha raça, luto pela cor, o que quer que eu faça é por nós, por amor. Jamais irei me calar diante de um ato tão desumano e desprezível”, postou Taison.
A Europa, de uma maneira geral, vive cenário de grande tensão na questão racial dos atletas de futebol. Um dos mais afetados é o italiano Mario Balotelli, do Brescia. Em Sofia, na capital da Bulgária, a seleção inglesa foi amplamente constrangida com cânticos racistas por torcedores do time da casa em jogo das Eliminatórias para Eurocopa, em outubro. A Bulgária vai jogar o próximo jogo com portões fechados e seis torcedores foram identificados e detidos.
A hostilidade direcionada aos negros no ambiente do futebol pode ser compreendida, de acordo com a socióloga Nathielly Ribeiro, pelo padrão social estabelecido desde a colonização. Já que, também no âmbito esportivo, houve tempo maior para que os negros pudesse se firmar. “O racismo no futebol parece contraditório porque trata-se de um esporte popular. Mas vai continuar garantindo um grupo racial dominante, que pertence à classe mais abastada. Por mais que essa classe integre os negros nesse ambiente, não acredita que esse ambiente é naturalmente dos negros. O que aconteceu com Taison, a expulsão, ilustra isso. A maneira como o racismo foi tratado. O comportamento da torcida foi mais grave que o do jogador. E o que vem sendo feito?”, questionou Nathielly, que é doutoranda em Sociologia pelo PPGD da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
No Brasil a norma que regula casos de racismo e injúrias raciais no futebol é o Estatuto do Torcedor. O Artigo 13, prevê que esses crimes, apontados pelo artigo 140 do Código Penal, sejam punidos com afastamento do estádio. O JC tentou falar com José Bispo, promotor do Juizado do Torcedor, mas não obteve resposta às ligações. Desde o segundo semestre, a CBF e a Conmebol anunciaram que iam seguir o novo Código Disciplinar da Fifa. O documento dá mais poder aos árbitros que podem paralisar a partida e advertir os torcedores até duas vezes antes de decretar o encerramento do jogo, caso as manifestações racistas não cessem. Sobre o caso de Taison e Dentinho, a Fifa afirmou que a responsabilidade sobre o caso é das autoridades ucranianas.