O universo feminino das artistas pernambucanas Dani Acioli, Gio Simões e Karina Agra

Anneliese Pires
Anneliese Pires
Publicado em 08/03/2017 às 9:06
Dani Acioli, Gio Simões e Karina Agra
Dani Acioli, Gio Simões e Karina Agra

Nesta quarta-feira (8), data em que é celebrado o Dia Internacional da Mulher, o Social1 conversou com três artistas plásticas pernambucanas que têm em comum o universo feminino como protagonista dos seus trabalhos: Dani Acioli, Gio Simões e Karina Agra. Elas falaram sobre feminismo, o papel da mulher na sociedade, padrões estéticos, a luta contra o machismo e, ainda, o que desejam para as mulheres do mundo todo. Confira:

Dani Acioli / Foto: Helder Ferrer Dani Acioli / Foto: Helder Ferrer

"Fomos criadas para competir; não pode ser assim", Dani Acioli

Criada em uma família de pais separados, a jornalista e artista plástica Dani Acioli aprendeu desde pequena sobre as necessidades que a mulher tinha em autoafirmar-se como um ser "capaz" de educar os filhos sem a presença do pai dentro de casa. Foi assim com a sua mãe. "Pra uma mãe era um fracasso uma filha casar grávida". Desenhar, na infância, era a sensação de liberdade que Dani precisava. Na adolescência, passou a escrever contos eróticos. "Minhas experiências foram tardias. Eu escrevia mais no âmbito da utopia e do desejo de me libertar... cresci paralelo a isso", confidencia.

Há três anos focada nas artes plásticas, Dani conta que o universo feminino sempre esteve presente em seu trabalho. "Quando a gente começa, não tem amadurecimento. Então era instintivo. Eu tinha necessidade de me colocar, de me posicionar como mulher, filha de pais separados. Sofria pressão da não falhar, além das cobranças de dar certo como mulher. Então, minha experiência é de uma alma inquieta. Entendi que nenhuma mulher precisava viver naquele universo, de cobranças, do que esperam da gente."

Dani Acioli / Foto: Andrea Rego Barros Dani Acioli em performance / Foto: Andréa Rêgo Barros

Em parceria com a Secretaria da Mulher do Recife, que homenageia a pernambucana Bárbara de Alencar - heroína que lutou pela liberdade e autonomia do País na Revolução Pernambucana de 1817 -, Dani Acioli criou a arte que ilustra as peças das redes sociais da Prefeitura do Recife e é a capa da agenda deste ano da Secretaria municipal. A artista lembra a importância de destacar as mulheres dentro das lutas históricas responsáveis pela construção do Brasil. "Grandes revolucionárias vão passando batidas, se não formos atrás para saber, ficarão escondidas."

Sobre a luta contra o machismo, Dani vai mais além. "É uma luta pessoal e diária que eu tenho comigo mesma, o tempo todo, em parceria com outras mulheres, trans, gays... Saber que tem um mundo novo e imenso para ser desbravado, é assim que sinto o universo feminino... Poder ser protagonista do que a gente quiser. Apenas do que a gente quiser."

 

Gio Simões / Foto: Bruna Valença Gio Simões / Foto: Bruna Valença

"Usar minha arte para ocupar espaços onde não se discute transfobia tem sido meu combustível", Gio Simões 

Caçula entre quatro irmãs, a artista plástica Gio Simões cresceu cercada por mulheres. Filha de estilista, Gio costumava passar as tardes, depois da escola, fazendo a tarefa de casa em cima de uma mesa de modelagem. "Impossível não ser influenciada por esse universo, minha arte fala de mim, do meu olhar, e é muitas vezes um processo inconsciente, que segue meu próprio processo de investigação". Sobre retratar o feminino, ela nem sabe explicar. "Quando criança, só desenhava mulheres, e não saberia explicar o motivo, ou origem disso. É tão natural pra mim quanto para um pintor que só retrata paisagens, tem a ver com fascínio", esboça.

Seu tempo nas artes plásticas é recente. Gio trabalhou com moda e, como empresária, ficou sem poder criar. "Foi quando decidi parar e repensar meu trabalho, e me descobri artista num processo de experimentação estética, que surgiu durante o tempo que morei em Berlim, de 2012 a 2014", pontua. Há três anos vivendo da arte e para a arte, Gio se considera feminista, mas não ativista. E explicou: "Acredito que o engajamento se dá de diversas formas, e também faço isso combatendo veemente o machismo e empoderando outras mulheres. Não sou tão ativista nas redes sociais, nem muito engajada em movimentos feministas, mas uso muito meu trabalho para ajudar jovens artistas a conseguirem espaço dentro desse mercado dominado por homens". Ela destaca, também, o trabalho que exerce com quem está começando no mercado. "O que eu faço é amadrinhar iniciantes e estudantes, e no fundo, muito mais do que transmitir conhecimento técnico, é um processo de empoderamento feminino e artístico".

Gio Simões e suas criações Gio Simões e suas criações / Foto: Divulgação

Em um ofício por muito tempo restrito a homens, Gio Simões ainda luta para vencer o preconceito por ser mulher. "Em várias ocasiões as pessoas se demonstraram surpresas com a qualidade técnica do meu trabalho quando me encontravam pessoalmente; 'além de bonita ainda é talentosa?' - o machismo disfarçado de elogio, como se estas características fossem antagônicas para uma mulher", desabafa.

A artista ressalta a importância de locais que promovem a iniciativa de incentivar as mulheres. "Um exemplo é a Casa do Cachorro Preto, que promove exposições apenas com artistas mulheres". Inclusive, nesta quinta-feira (9), acontece a abertura da quarta edição da 'Delas - A mostra das Mulheres', que contará com a participação de 20 artistas. Atualmente, Gio trabalha na série “Olhe para Ela” - ainda sem data para lançamento - que reúne retratos de mulheres trans e travestis que, assim como mulheres cis, também fazem parte de uma construção identitária feminina. "É um trabalho que tem me tocado muito ao longo do processo. Pensar que, de algum modo, posso usar minha arte para ocupar espaços onde não se discute transfobia tem sido meu combustível", afirma.

 

Karina Agra e a tela "A Casa das Primas" Karina Agra e a tela "A Casa das Primas" / Foto: Rodrigo Pires

"Não ter filhos e ser artista, ainda mais no Nordeste, já é motivo suficiente para ser feminista", Karina Agra

Artista plástica e arte-educadora, Karina Agra é licenciada em Educação Artística - Artes Plásticas, pela UFPE - e participa de exposições desde 1999. Ao explorar o figurativo, através da técnica de pintura acrílica sobre tela, Karina prioriza as personagens femininas, envolvidas no universo das cores saturadas, do kitsch, da sensualidade e da irreverência. Única mulher a fazer parte do time de grafiteiros escolhidos para dar cor à decoração de Carnaval do Recife deste ano, Karina diz que sua participação foi uma boa surpresa. "Começando pelo fato de não ser grafiteira, mas artista plástica, foi uma ótima surpresa! Mas, me perguntei o porquê de não colocarem mais mulheres, pois aqui está cheio de talentos femininos que já trabalham com a arte urbana", questiona. "Claro que estou muito feliz por fazer parte e enquanto artista me sinto também homenageada, pois, diferente dos carnavais passados, nossas artes ficarão presentes pela cidade", completa.

Com ateliê no bairro de Pau Amarelo, município de Paulista, a artista lembra também sobre o papel da mulher no meio artístico nos dias atuais. "Pensar que até o século 19 a mulher era considerada incapaz de criar artisticamente, ficando reduzida ao papel de musa ou da mulher de um 'grande pintor', há sim mais espaço, há oportunidades e esse processo é infindável, finalmente."

Karina Agra /Foto: Andrea Rego Barro Karina Agra /Foto: Andrea Rego Barro

Em uma luta constante em favor do feminismo, Karina destaca a importância de se manter contra o machismo. "Não ter filhos e ser artista, ainda mais no Nordeste, onde a cultura do machismo é bem resistente, já é motivo suficiente pra ser feminista". Ela também cita o fato de não poder sair sozinha à noite sem ser assediada. "É de uma violência que só nós mulheres entendemos". Seu engajamento acontece através das personagens retratadas nas telas, sempre altivas, seguras de si e que podem usar da sua sensualidade sem culpas. "Por sinal, achei maravilhosa a campanha do 'Pequeno Manual de como não ser um babaca no carnaval', ilustrada com as nossas artes da decoração do Carnaval. Espero que utilizem esse material durante o ano, em escolas e empresas, porque as mensagens são atemporais", finaliza.

Expectativas

Karina Agra defende que a causa feminina deve estar em alta diariamente. "Igualdade de gênero urgente! Não podemos ficar rotuladas a um dia do ano. Precisamos de respeito o ano inteiro!". Dani Acioli fala dos direitos: "Quero direitos iguais reconhecidos. Não como algo dado, e sim, por direito". Gio Simões deseja o empoderamento e união. "Que todas consigam adquirir consciência, se empoderar... E que juntas lutemos por uma sociedade livre dos padrões opressores patriarcais".

O Social1 parabeniza as mulheres e se une às vozes de todas que não só sonham, mas que lutam por igualdade, direitos respeitados e liberdade.

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