A casa e o ateliê de Roberto Lúcio

Mirella Martins
Mirella Martins
Publicado em 12/08/2013 às 8:10
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SENSAÇÃO Roberto Lúcio descobriu o universo da pintura pelo olfato (Fotos: Felipe Souto Maior/Divulgação) SENSAÇÃO Não pelos olhos. Roberto Lúcio descobriu o universo da pintura pelo olfato (Fotos: Felipe Souto Maior/JC Imagem)

Se não fosse a terebentina ... Foi um cheiro que fez Roberto Lúcio se interessar pela pintura e as artes plásticas. Paraibano, ele veio estudar Arquitetura no Recife. Mas, ainda no cursinho preparatório para o vestibular, se deparou com um ateliê infestado de terebentina (solvente de tinta óleo) e o odor invadiu não só seu olfato, como a mente e o coração. Foi o danado do solvente que fez Roberto Lúcio se descobrir pintor.  "É até estranho, porque o sentido do olfato geralmente leva a pessoa para a gastronomia, que nem existia nesse tempo. Mas o cheiro me atraiu para a pintura", comentou. Um agradável estranhamento, eu diria.

ARTISTA PLÁSTICO Roberto Lúcio considerou estudar arquitetura, mas se encontrou no mundo das artes plásticas ARTISTA PLÁSTICO Roberto Lúcio considerou estudar arquitetura, mas se encontrou no mundo das artes plásticas

Isso foi em meados de 1964,  época do Golpe Militar no Brasil. Roberto desistiu de prestar vestibular para Arquitetura e foi estudar Belas Artes na UFPE. "Na escola, já comecei a pintar, meu mundo era aquele mesmo e eu fiquei por ali", disse.

Já encontrado no universo artístico, Roberto Lúcio morou alguns anos no Recife e em outros lugares de Olinda, antes de se mudar para o atual endereço, na Rua do Amparo, onde vive sozinho. Segundo ele, havia um movimento muito interessante de artistas que fixavam residência na cidade alta. No local, existiam grandes espaços físicos para montar ateliê por um custo atraente. Ele foi um dos que abraçaram a ideia.

OLINDA Roberto Lúcio foi um dos artistas que migraram para instalar seus ateliês na cidade alta OLINDA Roberto Lúcio foi um dos artistas que migraram para instalar seus ateliês na cidade alta

A princípio, sua casa funcionava só como ateliê. Depois de um tempo, ele resolveu morar lá também. E assegura: "eu adoro a minha casa. Tem tudo o que eu quero, tudo o que me dá prazer está aqui. Tem a música que eu quero, tem uma paisagem maravilhosa, tem a comida que eu quero." E Roberto gosta de aproveitar qualquer tempo livre no local. É um homem instintivo. Costuma dormir tarde pintando, ou lendo, ou escutando música, sempre se ocupando. "Sempre tem coisa para fazer, não é? Mas não tenho uma rotina rígida. Acordo na hora que passa o sono, levanto e vou trabalhar", resume.

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PAISAGEM A vista da casa em Olinda , revelando Recife lá atrás PAISAGEM A vista da casa em Olinda, revelando Recife lá atrás

Apesar de apaixonado pelo local onde vive, Roberto Lúcio pode ser considerado um cidadão do mundo.  "Eu faria meu trabalho em qualquer parte do mundo", assegura. O artista já passou temporadas significativas na Alemanha e nos Estados Unidos, onde montou exposições e fez seu nome. A propósito, o período que passou na Europa e na América do Norte foram de grande valia para seu estabelecimento como pintor profissional. Quando perguntado sobre o momento em que teve certeza que era um artista plástico, ele aponta a experiência internacional como a grande reveladora. "Essa é uma pergunta muito complicada. Eu nunca tinha pensando nisso. Eu sempre tive vontade de trabalhar com criação, exercitar esse lado inventivo. Mas, ser artista é um fato que você tem sempre que estar retomando. O trabalho tem sempre que vir na frente do artista. O artista é consequência. Eu acho que o trabalho é a coisa mais importante, é fundamental. Quando meu trabalho passou a ter uma aceitação no lugar em que ninguém me conhecia, eu percebi que era algo interessante, foi quando me tornei artista", contou.

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Roberto Lúcio gosta de trabalhar com arte urbana, em torno de séries. Ele elege um tema e vai trabalhando em cima dele. Há muitos anos, na época do Governo de Miguel Arraes, o artista montou uma série chamada Tapumes, onde fotografou os tapumes espalhados pelo Recife,  em meio a reformas.  As mudanças dos objetos lhe chamavam atenção. "Sempre que passava eles iam se transformando. Um dia estava com cartazes, depois com tinta. Essa mistura me interessou", lembrou.

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Pai de dois filhos, Marina e Mateus, e avô de dois netos, o artista de 71 anos já deu aula, assessorou fábrica de tecidos, trabalhou com programação visual e arte gráfica. Ele acredita que sua pintura é a mistura de um monte de experiências que teve ao longo da vida e continua tendo. É um aglomerado de tudo. Roberto também aprecia o universo da fotografia, mas afirma que não tem conhecimento técnico sobre o assunto. "Não trabalho a fotografia, uso como um pintor usaria uma tela. Eu faço fotografia que me satisfaça plasticamente", considera.

DSC_2056 FOTOGRAFIA O artista não usa técnicas, apenas a plasticidade da técnica

Acima de qualquer coisa, Roberto Lúcio é um artista e um homem de seu tempo ou de qualquer tempo. Ele é ligado e acompanha as mudanças do mundo. Atento aos avanços tecnológicos, o artista acredita que a arte também está passando por transformações. Ele diz que a arte é atrelada ao pensamento do homem e por isso tem que acompanhá-lo.  "Tem gente que continua pintando as mesmas figurinhas, as mesmas coisas, contando uma história. A arte não é mais para isso. Com a velocidade e os aparelhos tecnológicos de reprodução, a arte também tem que evoluir", pondera.

FOTOGRAFIA O artista não usa técnicas, apenas a plasticidade da atividade

A opinião tão incisiva tem precedentes e onde se justificar. Roberto Lúcio fez mais exposições fora do que dentro do Brasil e pensa um pouco com a cabeça de quem já experienciou o universo artístico ao redor do mundo. "Me deram mais oportunidade e condições de fazer. Fiz poucas exposições no Recife, nenhuma muito grande. Eu acho o mercado do Recife muito amador. Mas isso é outra história ...", comenta.

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Por falar em participação em salões internacionais, Roberto Lúcio é um dos artistas que integra o acervo da exposição que aporta no Brasil ano que vem em comemoração ao Ano da Alemanha no Brasil. Um colecionador alemão, amigo seu, trará valiosas obras para ocupar centros culturais do Rio de Janeiro, Brasília e Recife. Duas pinturas sobre telas do paraibano radicado em Pernambuco estarão à mostra no Centro Cultural dos Correis ao lado de trabalhos de outros artistas internacionais. Veja mais fotos da visita à casa do artista na nossa galeria de imagens.

A vista da janela de Roberto Lucio - A vista da janela de Roberto Lucio
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O artista usa fotografia em seu trabalho - O artista usa fotografia em seu trabalho
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Da paisagem, dá para ver o Recife no fundo - Da paisagem, dá para ver o Recife no fundo

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