Hollywood usa Globo de Ouro para dar um basta aos abusos sexuais

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 08/01/2018 às 9:02
Atrizes e ativistas que participaram do protesto na cerimônia do Globo de Ouro 2018. (AFP PHOTO / TARA ZIEMBA)
Atrizes e ativistas que participaram do protesto na cerimônia do Globo de Ouro 2018. (AFP PHOTO / TARA ZIEMBA) FOTO: Atrizes e ativistas que participaram do protesto na cerimônia do Globo de Ouro 2018. (AFP PHOTO / TARA ZIEMBA)

Hollywood declarou neste domingo (7) no Globo de Ouro guerra ao assédio sexual e ao abuso de poder na indústria do entretenimento. As denúncias de assédio e estupro contra o antes poderoso produtor Harvey Weinstein revelaram uma cultura praticada por importantes personalidades da indústria, como Kevin Spacey, Brett Ratner, Dustin Hoffman e James Toback.

Várias investigações policiais foram abertas, mas ninguém até agora foi processado. A atriz indicada ao Oscar e apresentadora de TV Oprah Winfrey foi quem fez o discurso mais contundente da noite.

Confira a lista de vencedores do Globo de Ouro 2018

Ao agradecer o prêmio honorário Cecil B Demille, ela saudou o movimento #MeToo (EuTambém), que rapidamente ganhou força após as primeiras denúncias contra Weinstein. Homenageando Recy Taylor, uma afro-americana que ousou denunciar no mês passado, pouco antes de completar 98 anos, o estupro coletivo de que foi vítima em 1944 por parte de homens brancos, Winfrey condenou "uma cultura quebrada por homens brutalmente poderosos".

"Por muito tempo, as mulheres não foram ouvidas ou tiveram crédito quando ousavam falar a verdade sobre o poder desses homens. Mas a hora delas chegou. A hora delas chegou!", disse Winfrey à plateia, enquanto o público a aplaudia e alguns, inclusive, chegaram às lágrimas. "Então, quero que todas as meninas que estão nos assistindo agora saibam que há um novo dia no horizonte", disse Winfrey.

"E quando finalmente esse dia nascer, será por causa de muitas das mulheres magníficas - muitas das quais estão aqui nesta sala esta noite - e alguns homens especialmente fenomenais, que lutam duro para assegurar que elas se tornem as líderes que nos conduzam a um tempo em que ninguém nunca mais tenha que dizer 'eu também' de novo", afirmou.

Oprah Winfrey (Kevin Winter/Getty Images/AFP)

- Blecaute no tapete vermelho -

O Globo de Ouro abre a temporada de prêmios, sendo, portanto, a primeira vez que as grandes estrelas se reúnem desde que veio à tona o escândalo sobre o antes prestigiado produtor, três meses atrás. A maioria dos convidados vestiu preto no tapete vermelho, em sinal de repúdio ao casos de assédio e em solidariedade às vítimas. Durante a cerimônia, o anfitrião Seth Meyers não perdeu tempo e abordou o tema logo na abertura da festa.

"Damas e cavalheiros que restam", disse o mestre de cerimônias ao saudar a plateia. "É 2018, a maconha finalmente foi liberada e o assédio sexual finalmente não é", acrescentou. "Para os indicados na sala esta noite, esta é a primeira vez em três meses que não será assustador ouvir seu nome sendo lido em voz alta", prosseguiu.

A atriz Meryl Streep, acusada de saber e calar sobre os abusos de Weinstein, produtor de vários de seus filmes, disse mais cedo no tapete vermelho que "as pessoas estão conscientes do desequilíbrio no poder". Isto "levou ao abuso em nossa indústria (...) Está em todas partes", acrescentou Streep, ao lado de Ai-jen Poo, diretora de uma organização de defesa dos direitos das trabalhadoras domésticas.

- "Gerar mudanças" -

Durante a festa foram entregues no total 25 prêmios, 14 para o cinema e 11 para a televisão. Nicole Kidman levou o primeiro prêmio da noite por seu papel em "Big Little Lies", que confirmou o favoritismo e faturou quatro das seis estatuetas a que estava indicada.

"Minha mãe foi uma defensora do movimento de direitos das mulheres quando estava crescendo e por ela estou aqui", disse Kidman, ao receber a estatueta. "Este personagem que fiz representa algo que é o centro da conversa agora mesmo. Acho e espero que podemos gerar mudanças através dessas histórias".

Laura Dern, Nicole Kidman, Zoe Kravitz, Reese Witherspoon e Shailene Woodley, da série Big Little Lies (AFP PHOTO / Frederic J. BROWN)

A série também ficou com os prêmios de Melhor minissérie ou telefilme e de melhores atriz e ator coadjuvantes para TV, atribuídos, respectivamente, a Laura Dern e Alexander Skarsgard. "The Handmaid's Tale", que tinha três indicações, ficou com os prêmios de Melhor série de TV dramática e melhor atriz dramática (Elizabeth Moss).

O filme "Três anúncios para um crime" foi o mais premiado da noite, com quatro estatuetas: melhor filme dramático, melhor atriz dramática (Frances McDormand), melhor ator coadjuvante (Sam Rockwell) e Melhor roteiro.

Com sete indicações, "A forma da água" levou as estatuetas de melhor diretor para Guillermo del Toro e de melhor trilha sonora. O filme fantástico, que ganhou o Leão de Ouro em Veneza, conta a história de amor entre uma zeladora e uma criatura anfíbia mantida em um tanque de água em uma instalação militar dos Estados Unidos em plena Guerra Fria.

Foi uma surpresa não ter havido nenhuma diretora indicada apesar do grande ano que tiveram Greta Gerwig ("Lady Bird - A Hora de Voar"), Patty Jenkins ("Mulher Maravilha"), Dee Rees ("Mudbound - Lágrimas Sobre o Mississipi"), Kathryn Bigelow ("Detroit em Rebelião") e Sofia Coppola ("O Estranho que Nós Amamos").

O filme chileno "Uma Mulher Fantástica", do diretor Sebastián Lelio, perdeu o prêmio de melhor filme estrangeiro para "In the Fade (Em pedaços)", uma coprodução entre França e Alemanha, dirigida por Fatih Akin.