[Rewind] - Sexta-Feira 13 (1980)

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 13/10/2017 às 13:13
Friday the 13th (1980)
Friday the 13th (1980) FOTO: Friday the 13th (1980)

O primeiro capítulo da série Sexta-Feira 13 é um caso clássico de filme que muita gente conhece, mas poucos realmente viram. 

Assistindo hoje em dia, quando vários elementos icônicos da série estão fundamentados em nosso inconsciente, o primeiro filme nem parece pertencer à série. Principalmente porque não tem Jason. Quer dizer... até tem, mas não como você está acostumado. 

Vale dizer que nessa, usei principalmente o documentário Crystal Lake Memories, lançado em 2013 mas que nunca chegou a sair aqui no Brasil - e dois livros: Sexta Feira 13 - Arquivos de Crystal Lake, do norte-americano David Grove, lançado aqui pela Darkside Books e Crystal Lake Memories: The Complete History of Friday the 13th, de  Peter M. Bracke, que também não foi lançado no Brasil, mas está disponível em versão digital para Kindle. 

Sexta-Feira 13 foi lançado em 1980, com direção e produção de Sean Cunningham e roteiro de Victor Miller. Cunningham tinha produzido alguns filmes infantis e de pornô soft nos anos 70, mas o seu maior sucesso foi o terror Aniversário Macabro (The Last House on the Left) de 1972, com direção do seu amigo Wes Craven - que mais tarde viria a criar e dirigir as séries A Hora do Pesadelo, com Freddy Krueger, nos anos 80 e Pânico, nos anos 90. 

Com o sucesso de Halloween em 78, dirigido por John Carpenter, Cunningham se sentiu motivado a voltar ao gênero horror. Ele se juntou com Miller para produzir um slasher movie nos mesmos moldes. Mas as semelhanças entre Halloween e Sexta-Feira 13 ficam mesmo por aí, porque Cunningham e Miller procuraram se distanciar do filme de Carpenter, mudando vários elementos do enredo tais como a locação, a motivação do assassino e, principalmente, as mortes elaboradas que aconteceriam. 

O mago Savini

Para fazer essa última parte, os produtores contaram com uma ajuda de luxo: Tom Savini, que tinha feito a maquiagem do clássico filme de zumbis de George Romero, Despertar dos Mortos, em 78. Ele se uniu à equipe para desenvolver os efeitos especiais de Sexta-Feira 13. Savini na época ainda era desconhecido do grande público, mas teve sua carreira catapultada graças aos efeitos incríveis que criou para esse filme. 

Tom Savini e Ari Lehman (maquiado como Jason), no set de Sexta-Feira 13. Foto: Savini.com

Cunningham gosta de contar uma história que a primeira coisa que surgiu do filme foi o nome “Sexta-Feira 13”, antes de elenco, roteiro ou qualquer outra coisa. Ele teria bolado esse nome e feito um anúncio na revista Variety sobre o “filme de terror mais aterrorizante já feito” que estaria por vir, para assim tentar conseguir mais dinheiro para a produção.

De acordo com o livro Sexta-Feira 13 - Arquivos de Crystal Lake isso é conversa. Cunningham e Miller já vinham trabalhando no roteiro quando o anúncio foi publicado. E esse anúncio só foi feito pois um outro filme chamado Sexta-Feira 13 também estava em produção na mesma época, e Cunningham queria garantir o nome.

O anúncio publicado por Cunningham na Variery e o pôster de The Orphan - Friday 13th, lançado em 1979

O filme Sexta-Feira 13 nasceu de fato quando Miller, em suas conversas com Cunningham, teve a idéia de criar uma história que se passasse num acampamento de verão. Era uma forma de colocar os jovens adolescentes isolados dos adultos e à mercê do assassino do filme.  

A próxima ideia foi deixar o assassino oculto durante a trama, e revelá-lo só no terceiro ato. Na sequência, outro diferencial: o vilão não seria um homem, e sim uma mulher - na verdade uma senhora de meia idade. Lembra que eu falei que não tinha Jason? Pois é, o assassino do primeiro filme é na verdade a mãe dele, Dona Pamela Vorhees.  Se você não sabia, toma esse spoiler agora. 

As filmagens foram feitas num acampamento de verão de verdade, em Nova Jérsei.  O elenco foi quase todo formado por pessoas que estavam dispostas a morrer na tela das piores maneiras possíveis, ou seja, gente jovem e com um salário baixo. Dá para destacar três pessoas:Harry Crosby, filho do cantor Bing Crosby; Betsy Palmer, que faz Pamela Vorhees - e já era uma atriz respeitada da Broadway quando aceitou o papel (e se arrependeu logo depois) - e o iniciante Kevin Bacon, em seu primeiro papel mais importante em Hollywood.  Quatro anos mais tarde ele estouraria em Footloose. 

Prólogo e início

Sexta-Feira 13 se passa, em sua maior parte, no dia 13 de junho de 1979 - que por sinal, não era uma sexta-feira, e sim uma quarta. Mas, ele tem um prelúdio em 13 de junho de 1958 - agora sim, uma sexta - (vinte e um anos antes, com as duas primeiras vítimas).   

Começa mostrando o Camp Crystal Lake, que será o cenário da maior parte dos próximos filmes. Já ouvimos também a música tema do filme, feita por Harry Manfredini. Diferente do que muitas pessoas acham, o famoso "Chi, chi, chi; ha, ha, ha" é na verdade "ki, ki; ma, ma, ma". Como vocÊ só escuta a música logo antes de um assassinato, a ideia de Manfredini é que Pamela Voorhees sofre de esquizofrenia, e está ouvindo na sua mente seu filho Jason falar: "kil kil kil, mom mom mom". 

Barry e Claudette então se separam do grupo e vão para o quarto. Não por acaso, esse é o casal que posteriormente descobrimos que deveria estar tomando conta das crianças quando Jason morre afogado. Ao invés disso estavam transando, e iam transar novamente agora, antes de serem interrompidos. E mortos. 

Pulamos então para 1979. Camp Crystal Lake ficou fechado por 20 anos depois dos assassinatos, mas está para ser reaberto e um grupo novo de monitores precisa ser treinado. Menina Annie chega na cidade e pára para perguntar onde fica o tal acampamento, causando o maior climão no café. O caminhoneiro Enos se propõe a dar uma carona para a moça, e a dupla é interrompida por um personagem clássico da série, Crazy Ralph. 

Depois do alerta apocalíptico, os dois seguem para o lago. Enos conta para Annie a história do Camp Crystal Lake, ou Camp Blood como os habitantes da cidade o chamam. Nos últimos anos houveram várias tentativas de reabrir o acampamento, mas nunca dava certo. O lugar é assombrado. Ele fala inclusive do afogamento em 1958, mas não cita o nome da vítima. 

Enos deixa Annie na estrada e ela tem que andar o resto do caminho. Corta para o resto do grupo, incluindo Kevin Bacon, que também estão chegando. Conhecemos então Alice, que é uma linda e vai ser nossa mocinha na história. Os produtores pensaram em colocar um protagonista masculino, mas acharam que ia ficar estranho ele ser perseguido por uma senhorinha no final. 

Mortes e mais mortes

O pessoal tem que aprontar o acampamento, que espera reabrir em duas semanas, mas as perspectivas não são boas. Cada um recebe uma função e eles se dividem na tarefa. Na estrada, Annie ganha uma carona, mas não vemos o motorista (o que em filmes de terror é sempre um mal sinal). Eles passam direto da entrada do acampamento e Annie fica assustada. Ela consegue pular do carro e fugir, mas muito machucada não consegue ir longe, e acaba se tornando a primeira vítima do grupo. 

Na sequência temos a cena da cobra no quarto, que tem uma história triste. Ela foi improvisada a partir de uma experiência que o próprio Tom Savini teve durante as filmagens, quando uma cascavel entrou no seu quarto.  O problema é que na filmagem usaram uma cobra de verdade, que foi realmente morta em cena. A questão dos maus tratos a animais ainda não forte na época, e ficou por isso mesmo. 

Um policial chega ao acampamento procurando pelo Crazy Ralph, que foi visto na região. Essa é uma das muitas tentativas de despistar do público quem é o verdadeiro assassino - Que por sinal, não demora a agir. Ned, o engraçadinho do grupo, é a próxima vítima. Mas a morte dele a gente não vê, só fica sabendo depois. 

Marcie e o Kevin Bacon entram num dos chalés para se protegerem da chuva, mas a gente já sabe o que vai acontecer mesmo, né? E como se tornará regra nos próximos Sexta-Feira 13 - e em muitos filmes de terror do gênero pelos anos seguintes - é transou = morreu.  É uma oportunidade de vermos Tom Savini no seu melhor. Kevin Bacon tem a melhor morte do filme, que é a inesquecível flecha na garganta, que foi particularmente complicada de filmar. Todo corpo de Kevin é um boneco, só a cabeça é real e o ator ficou por baixo da cama. 

Marcie sai da cabana para ir ao banheiro e toma uma machadada na cara.

Em outro chalé, o povo tem a genial ideia de jogar Strip Banco Imobiliário, onde ao invés de dinheiro falso eles usam as próprias roupas. Tudo isso tomando Budwaiser em garrafa de remédio. Nessa cena também temos outro elemento icônico dos filmes da série, que é a maconha, que sempre rola solta nos filmes da franquia.

Alice é muito boa no jogo e consegue ficar vestida, mas Brenda é muito ruim e tem que ir só de calcinha e sutiã fechar as janelas do seu chalé por causa da chuva. Ela ouve uma voz pedindo ajuda e resolve ir ver o que é, só para morrer logo em seguida ( em outra cena que não vemos e só ficamos sabendo depois como aconteceu).

Steve, que estava na cidade até agora comprando suprimentos, resolve voltar no meio da chuva. O carro quebra e ele consegue uma carona com um policial e quando chega ao acampamento é surpreendido e morto também. O interessante é que ele parece reconhecer seu assassino.

Terceiro ato

Só sobraram Alice e Bill agora. Eles vão para o quarto das garotas e encontram o machado ensanguentado. Os telefones estão mudos e o carro quebrado. Eles também estão sem energia e Bill parte para consertar o gerador. Alice estranha a demora do rapaz em voltar e decide ir sozinha até o gerador, só para encontrar Bill pregadão atrás da porta. A moça volta correndo para o chalé, e a melhor forma de trancar a porta que ela consegue pensar é amarrando. Ela ainda fecha as cortinas de pano com toda força, para trancar bem.

Mas não adianta. O corpo de Brenda vem voando pela janela e Alice agora tem que desfazer toda proteção que construiu e fugir do chalé. Ela dá de cara com um jipe e uma senhorinha simpática que aparentemente veio ao seu resgate. Apresento-lhes Palema Vorhees, a mãe do Jason, que a princípio se finge de boazinha.

As duas voltam para o chalé e Dona Vorhees conta toda história do afogamento do Jason e como os monitores foram culpados. Ela então liga o modo psicopata e parte para matar Alice. Começa então o embate final entre Alice e Pamela, que se inicia no chalé e segue para a área externa do acampamento, com direito a tapa de mão aberta e coronhada na virilha.

Na beira do lago, depois de mais alguns golpes coreografados de forma brilhante, Alice consegue pegar o facão e corta a cabeça da dona Vorhees fora, numa das cenas mais clássicas dos filmes de terror. 

Com a assassina derrotada, Alice pega uma das canoas e vai para o meio do lago, sabe-se se lá porquê. Parece que vai ficar tudo bem, o sol nasceu e a música é calma e bem anos 80. O pesadelo acabou… Só que não. Jason sai da água e agarra Alice, puxando-a para o fundo do lago. A ideia desse último susto tem muitos pais: Savini, Miller e Cunningham, cada um diz que a sugestão foi sua. Mas a mãe é sempre a mesma: a cena final de Carrie, a Estranha, que serviu de inspiração.

A última cena é com Alice acordando no hospital. Os médicos dizem que ela está bem, e que foi encontrada sozinha no lago. Mas onde está o Jason? Os policiais dizem que nenhum garoto foi achado. E foi assim que Sexta-Feira 13 saiu dos cinemas para entrar na história. Com um orçamento de 550 mil dólares, o filme faturou quase 40 milhões em bilheteria, e se tornou uma das franquias de horror de maior sucesso do cinema, com 12 filmes no total.

Apesar da cena final, nem o diretor, nem o roteirista pensavam em fazer qualquer continuação - por sinal, isso não era comum na indústria na época. Mas com tanto sucesso, Sexta-Feira 13 - Parte II entrou em produção logo em seguida, dessa vez com um novo vilão: agora sim, Jason Vorhees em cena - já adulto e ainda sem a máscara de hóquei, que só viria no terceiro filme. Mas isso já é outra história.