Dispositivos anticensura na mira da 'Grande Muralha' informática chinesa

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 07/08/2017 às 21:24
Foto: Greg Baker / AFP
Foto: Greg Baker / AFP FOTO: Foto: Greg Baker / AFP

Por AFP

A China declarou guerra aos dispositivos que permitem evitar a censura na internet, e por isso empresas e internautas temem, após a recente capitulação da Apple, que esses "túneis" sob a "Grande Muralha informática" da rede chinesa desapareçam.

Segundo diferentes estimativas, dezenas de milhões de pessoas na China recorrem a redes privadas virtuais (VPN) para se conectar a páginas ou redes sociais bloqueadas pelas autoridades, como Facebook, Twitter, Google e vários meios estrangeiros.

LEIA MAIS

» Sabe o que é VPN? Saiba os riscos e benefícios de usar o serviço no seu celular

» China lança seu primeiro telescópio espacial de raios-X

» China faz alerta sobre novo vírus ransomware

» Descoberta na China espécie de dinossauro gigante parecido com ave

Após anos de tolerância, o governo endureceu sua posição: em janeiro, anunciou sua intenção de proibir o uso dos VPN não autorizados e a exigência de autorização para os desenvolvedores.

Como consequência, a americana Apple suprimiu, no final de julho, da sua "app store" chinesa a maioria dos aplicativos que permitem acessar uma VPN, alegando "novas regulamentações".

Um golpe para os internautas chineses, entre eles muitos críticos à "capitulação" da Apple, que fortalece os rumores de que Pequim se dispõe a restringir drasticamente o acesso às VPN.

"Já tinha se falado várias vezes de uma campanha contra as VPN, e as empresas, tanto chinesas como estrangeiras, estão acostumadas às perturbações", já que algumas VPN são bloqueadas temporariamente pelas autoridades, explica Graham Webster, pesquisador da faculdade de Direito da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. "Mas esta vez parece muito diferente", diz com preocupação durante uma entrevista à AFP.

Os sinais de endurecimento se multiplicam. Muitos hotéis de luxo de Pequim que ofereciam aos hóspedes um acesso à internet "sem censura" foram obrigados a retirar esse serviço.

Na quinta-feira passada, um serviço chinês de armazenamento em nuvem notificou seus usuários que, por ordem das autoridades, ia fechar e sinalizar à agência de Segurança Pública de Pequim os fornecedores de VPN entre seus clientes.

Empresas e usuários nervosos na China

"Estão bloqueando o único modo de ver séries americanas e de manter contato com meus amigos do Facebook", lamentava um usuário da rede de microblogs Weibo.

As empresas compartilham o nervosismo dos usuários, já que se desconhece a amplitude da nova regulamentação e o impacto que esta terá em suas atividades.

Em uma pesquisa recente, quase metade das empresas europeias se mostravam preocupadas com o "impacto econômico" de um novo endurecimento, visto que a censura atual da web já afeta seus lucros.  "O sucesso de nossas empresas depende de um acesso instantâneo à informação e à possibilidade de comunicar com rapidez", afirma à AFP William Zarit, presidente da Câmara de Comércio americana na China.

Especialista diz que o governo chinês tem 'Capacidade para fechar tudo'

No entanto, para James Gong, especialista no meio cibernético chinês da Herbert Smith Freehills, o endurecimento da regulamentação não será direcionado aos usuários profissionais.

O governo tem "a capacidade para fechar tudo, mas não é seu objetivo. A ideia é que todo o tráfego passe pelas operadoras de telecomunicações chinesas, para estar por dentro de todas as conexões", indica.

Paul Triolo, especialista do Eurasia Group, tem a mesma opinião. O objetivo seria "saber quem se conecta a cada site e bloquear seletivamente certos acessos se for necessário".

O Ministério da Indústria e Tecnologias da Informação chinês explica à AFP que as empresas só estariam autorizadas a assinar os serviços de VPN oferecidos "por operadoras de telecomunicação" estabelecidas na China que respeitem as regras.

"É muito improvável que o acesso às VPN seja bloqueado totalmente", considera Weber. Mas recorrer a esses dispositivos será "mais caro e muito mais controlado pelo governo".