A tecnologia a serviço dos mistérios do antigo Egito

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 05/08/2017 às 10:58
Foto: Khaled Desouki / AFP
Foto: Khaled Desouki / AFP FOTO: Foto: Khaled Desouki / AFP

Por Emmanuel Parisse / AFP

Das pirâmides de Gizé até os túmulos de Luxor, os segredos do antigo Egito continuam desafiando a humanidade, mas cientistas equipados com instrumentos cada vez mais sofisticados tentam desvendar os mistério dessa extraordinária civilização.

Em 1º de julho de 1798, o general Bonaparte desembarcava em Alexandria junto com 40 mil homens para tentar bloquear a passagem do caminho das Índias para os ingleses. Chegou acompanhado de dezenas de cientistas e artistas, que estabeleceram as bases da Egiptologia moderna.

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Há mais de 200 anos, os egiptólogos usam a ciência para revelar segredos sepultados há milênios sob as areias do deserto egípcio. Para atingir esse grandioso objetivo, hoje os cientistas instalam aparelhos eletrônicos ou recorrem às modernas técnicas químicas.

Embora a química ainda precise de amostras - por menores que sejam -, os novos métodos não invasivos permitem preservar os vestígios arqueológicos.

Mistérios e especulações

Conjugando termografia a infravermelho, muografia - tecnologia baseada na detecção de partículas múons - e simulação 3D, o ScanPyramids é um dos projetos mais ambiciosos já elaborados para revelar os mistérios da pirâmide de Quéops - conhecida como a Grande Pirâmide de Gizé -, uma das Sete Maravilhas do mundo Antigo, construída há 4.500 anos.

Em outubro passado, o ScanPyramids revelou que a grande pirâmide pode conter cavidades desconhecidas. "Todos os dispositivos instalados (...) estão destinados a localizar a cavidade com precisão. Sabemos que existe, mas buscamos localizá-la com exatidão", explica Mehdi Tayoubi, presidente e cofundador do Hip Institute, que dirige o projeto ScanPyramids.

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Os dispositivos de múons são emulsões químicas desenvolvidas pela Universidade de Nagoya, ou captores eletrônicos do laboratório japonês de pesquisa sobre partículas KEK, ou telescópios de múons fabricados na França. Depois, os resultados obtidos deverão ser confrontados com a observação por raios infravermelhos e 3D. Há séculos, um insondável mistério envolve a construção das pirâmides.

O mesmo acontece com Nefertiti, a rainha egípcia de lendária beleza, esposa de Akhenaton, nascida há cerca de 3.400 anos. Sua múmia nunca foi encontrada, e cada um tem sua teoria sobre a localização de seus restos mortais.

O egiptólogo britânico Nicholas Reeves está convencido de que estão ocultos no túmulo de Tutankamon, no Vale dos Reis, perto de Luxor.

Em 2015, as autoridades egípcias fizeram um exame da tumba do famoso faraó, usando um radar. Na ausência de resultados definitivos depois daquela operação amplamente coberta pela imprensa, o debate empacou.

Para sair desse impasse, uma equipe da Universidade Politécnica de Turim fará medições com outros métodos: tomografia, segundo a técnica já utilizada pela Medicina, a magnetometria (medida do campo magnético) e o georradar, concebido para "ouvir" os solos.

Segundo o arqueólogo egípcio Zahi Hawass, não existe câmara secreta no túmulo de Tutankamon. Ele afirma ainda que Nefertiti, adoradora do deus Aton, nunca poderia ter sido enterrada no Vale dos Reis.

Trabalho de formiga no Egito

Por enquanto, nem o Ministério egípcio de Antiguidades, nem o Politécnico italiano quiseram se manifestar sobre a existência, ou não, de uma câmara secreta - sem dúvida para evitar repetir o fiasco de experiências anteriores.

Longe da agitação midiática, o laboratório de datação do Instituto Francês de Arqueologia Oriental (IFAO), com sede no Cairo, trabalha em outro grande projeto: tornar mais precisa a cronologia do Egito Antigo.

Instalada na capital egípcia desde 1880, essa prestigiosa instituição conta com um laboratório de datação e com outro destinado à análise de materiais.

"Para o Egito Antigo, a cronologia não está definida claramente. Recorre-se a uma cronologia relativa, fala-se de império antigo, médio e novo, há referências a reinos, a dinastias, mas não se sabe exatamente de que data se está falando", explica Anita Quilès, responsável pelo serviço de arqueometria do IFAO.

Em meio a essas inovações, Zahi Hawass adverte que a ciência não pode substituir os arqueólogos. "Nos últimos dez anos, a tecnologia trouxe coisas boas, mas não podemos deixar os cientistas anunciarem descobertas sem que sejam examinadas pelos arqueólogos", frisou.

© Agence France-Presse