Metáforas misteriosas de David Lynch sobre a volta de "Twin Peaks"

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 06/05/2017 às 14:30
AFP PHOTO / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Frederick M. Brown
AFP PHOTO / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Frederick M. Brown FOTO: AFP PHOTO / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Frederick M. Brown

No cinema de David Lynch, de "Eraserhead" a "Veludo Azul" passando por "Cidade dos Sonhos", a fronteira entre a realidade e o onírico sempre é tênue. E entrevistar o lendário diretor também é navegar em águas desconhecidas.

Lynch encadeia metáforas sobre peixes e galinhas, parece insinuar que não fará mais filmes para o cinema e mantém o mistério sobre os novos episódios da mítica série "Twin Peaks".

A série, que revolucionou a produção de televisiva em 1990, volta 25 anos depois, a partir de 21 de maio no canal Showtime, que divulgou apenas um teaser voltando a locais emblemáticos dessa saga policial.

Lynch é considerado um dos maiores diretores de sua geração e passou os últimos anos fazendo videoclipes e curta-metragens, além de pintar, compor e desenhar. Seu último longa-metragem, "Inland Empire" ("Império dos Sonhos"), que estreou em 2006 nos Estados Unidos, arrecadou apenas 4 milhões de dólares apesar de ter no elenco estrelas como Laura Dern e Jeremy Irons.

"As coisas mudaram muito nesses 11 anos, e uma dessas coisas é a forma como as pessoas percebem os filmes, o fato de que muitos deles não funcionem bem nas bilheteria apesar de serem grandes filmes", diz. "E as coisas que fazem sucesso nas bilheterias não são as que eu queria fazer".

Isso quer dizer que já rodou seu último longa-metragem para o cinema? "Acredito que sim", responde, acrescentando que nesse momento a televisão é "um lugar precioso".

- Evento televisivo -

A trama dos oito episódios da primeira temporada de "Twin Peaks" - Quem matou Laura Palmer? - fascinou uma geração de espectadores a partir de 1990 e abriu caminho para um nova forma de fazer ficção televisiva de qualidade.

O entusiasmo do público e da crítica esfriou durante a segunda temporada, com 22 episódios, em que se revela a identidade do culpado. Mas "Twin Peaks" já tinha se transformado em um obra cult, e sua volta é um dos eventos mais esperados do ano na televisão.

David Lynch e sua equipe mantiveram em segredo os detalhes dos 18 novos episódios, que têm no elenco Kyle MacLachlan, no papel do agente Dale Cooper, e que se desenvolvem passados 25 anos do final da segunda temporada.

Antes da entrevista coletiva de Lynch em Los Angeles, foi pedido que os jornalistas não perguntassem nada sobre "a trama, os personagens e os lugares", mas até as perguntas mais gerais sobre "Twin Peaks" 2017 só tiveram respostas vagas. "As ideias são como peixes. Se você quer um peixe, põe a isca no anzol, joga na água e espera que a ideia - oh, um peixe - se aproxime e você possa pegar", disse Lynch em relação à sua filosofia como cineasta.

"Depois, a pergunta é: gostamos desse peixe? Dessa ideia?", acrescentou.

Quando perguntado se a revelação do assassino de Laura Palmer poderia ter significado o fim da série original, lança outro subterfúgio metafórico sobre matar ou não a galinha dos ovos de ouro.

O diretor de 71 anos, seguidor fervoroso da meditação transcendental, não deixou claro se os novos episódios são voltados principalmente para os fãs da série ou se espera conquistar a nova geração de espectadores.

"Sempre disse que há uma expressão védica: 'O homem tem o controle da ação, não dos frutos dessa ação'". Assim, "quando termina algo, perde o controle sobre isso, e é o destino que decide", concluiu com ar enigmático.

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