RetroBit: Primeira viagem do Zeppelin ao Brasil completa 85 anos

Letícia Saturnino
Letícia Saturnino
Publicado em 15/05/2015 às 16:07

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Foto: Jobson Figueiredo/Cortesia. Graf Zeppelin (LZ-127) sobrevoando a Rua da Aurora, bairro da Boa Vista, década de 1930. Ao longe, é possível ver a torre e a cúpula da Faculdade de Direito do Recife e, em primeiro plano, os sobrados da Aurora. (Revista: O Cruzeiro. Ano II. Nº 84].

Apontou! / Parece uma baleia se movendo no ar! / Parece um navio avoando nos ares! / Credo, isso é invenção do cão! / Ô coisa bonita danada! / Viva seu Zé Pelim! / Vivaôôô.

- Ascenso Ferreira, poeta pernambucano, 1930.

O gigantesco dirigível Graf Zeppelin foi a maior façanha humana nos ares por muitos anos. Com 236 metros de comprimento, cruzava oceanos e chegou a realizar uma volta ao redor do mundo no início do século passado, quando voar representava o maior desafio da tecnologia até então. A relação do Zeppelin com o Recife sempre foi estudada, mas ainda hoje é pouco conhecida. A cidade mantém intacta a torre de atracamento, única no Brasil, aberta à visitação no parque científico no bairro do Jiquiá.

No próximo dia 22 de maio completam 85 anos da primeira viagem do Zeppelin ao Recife. Foi a primeira vez que um veículo aéreo cruzava o Atlântico vindo da Europa à América Latina. Por aqui, tripulação e passageiros desembarcavam e o dirigível era reabastecido com gás e suprimentos. A cena foi tão espetacular para os habitantes da época que até hoje as imagens são admiradas em fotografias, selos e cartões postais.

Para celebrar a data será lançado o livro "O Zeppelin no Recife", com 30 imagens selecionadas pelo historiador Dirceu Marroquim e pelo artista plástico e restaurador Jobson Figueiredo, este último uma das maiores autoridades no Brasil sobre a era dos Zeppelins. São fotos antigas, muitas delas inéditas, que mostram cenas e bastidores deste grande feito para o Brasil. As imagens foram feitas pelos próprios tripulantes durante a passagem do Zeppelin. O lançamento será no Museu da Cidade do Recife, no dia 22 de maio, às 19h. Parte dessas fotos publicamos com exclusividade aqui no MundoBit.

Atracação do Zeppelin no Campo do Jiquiá. Recife, década de 1930. O Estado deu apoio total à construção das instalações do pouso. (Fritz Dettmann. Zeppelin – Gestern und Morgen – Geschichte der deutschen Luftschiffahrt von Friedrichshafen bis Frankfurt am Main / Acervo Jobson Figueiredo). Atracação do Zeppelin no Campo do Jiquiá. Recife, década de 1930. O Estado deu apoio total à construção das instalações do pouso. (Fritz Dettmann. Zeppelin – Gestern und Morgen – Geschichte der deutschen Luftschiffahrt von Friedrichshafen bis Frankfurt am Main / Acervo Jobson Figueiredo).

O Zeppelin no Recife

Recife passou meses se preparando para a chegada do Graf Zeppelin LZ 127. O prefeito à época, Francisco da Costa Maia chegou a decretar feriado municipal e a cidade vivia um clima de festa. Segundo registros em jornais, cerca de 15 mil pessoas e dois mil veículos foram até o Jiquiá presenciar a chegada do dirigível.

"Tudo foi preparado para mostrar uma cidade preparada, com pompa. O Estado deu o campo, água, luz elétrica, coisas que eram escassas à população da época", explica Jobson Figueiredo. "Além da torre de atracação foi construído ainda um pavilhão de 315m², onde ficavam a sala de embarque, lojas de venda. Tinha até uma lagoa para os resíduos, que ficou conhecida como Lagoa da Morte".

A travessia do Atlântico, vindo da Europa, durava entre três a quatro dias. O dirigível Graf Zeppelin tinha capacidade para receber de 20 a 25 passageiros, além de uma capacidade de carga que possibilitava trazer um carro. "Nenhum avião do período conseguia atravessar grandes distâncias e navios levavam meses para chegar, por isso o Zeppelin foi a primeira ligação direta da América com a Europa", diz Jobson. "Era muito luxuoso, algo reservado apenas a príncipes, alta burguesia e industriais ricos", explica.

Zeppelin (LZ-127) sobrevoando arrabalde do Recife. É possível visualizar a silhueta de uma chaminé e o Rio Capibaribe. O dirigível, devido à sua estabilidade, poderia ficar parado no ar durante diversos dias sem abastecer. Isto aconteceu, por exemplo, no Recife, por conta dos intensos conflitos que contribuíram para a denominada Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas à presidência. (Mit Dem Luftschiff Nach Pernambuco von 17. bis 28. Outubro 1931 / Acervo Jobson Figueiredo). Zeppelin (LZ-127) sobrevoando arrabalde do Recife. É possível visualizar a silhueta de uma chaminé e o Rio Capibaribe. O dirigível, devido à sua estabilidade, poderia ficar parado no ar durante diversos dias sem abastecer. Isto aconteceu, por exemplo, no Recife, por conta dos intensos conflitos que contribuíram para a denominada Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas à presidência. (Mit Dem Luftschiff Nach Pernambuco von 17. bis 28. Outubro 1931 / Acervo Jobson Figueiredo).

Hotel nos ares

O primeiro Zeppelin que chegou ao Brasil, atracando no Recife, foi o LZ127. Ele tinha 236 metros de comprimento e 30 metros de diâmetro. Tinha em seu interior suítes, banheiros, salas de jantar e estar.

Surge depois, em 1936, um novo zeppelin, ainda maior, mais bonito, mais imponente — o Hindenburg LZ-129. Tinha 245 m de comprimento, 41,2 m de diâmetro e voava a 135 km/h com autonomia de 14 mil km e podia transportar 50 passageiros e 45 tripulantes. Parecia um hotel voador, com sala de jogos, estar, restaurante e cabines luxuosas. Foi necessária a troca da torre de atracação do Zeppelin por uma torre que pudesse receber o LZ-127 e o LZ-129.

Graf Zeppelin (LZ-127) sobrevoando o bairro de Santo Antônio. Recife, década de 1930. É possível ver o Palácio da Justiça, à época, recém-inaugurado, e parte do Liceu de Artes e Ofícios. Observar que ainda não havia a Av. Dantas Barreto. Suástica no dirigível mostra força do nazismo da época. (Acervo do Museu da Cidade do Recife). Graf Zeppelin (LZ-127) sobrevoando o bairro de Santo Antônio. Recife, década de 1930. É possível ver o Palácio da Justiça, à época, recém-inaugurado, e parte do Liceu de Artes e Ofícios. Observar que ainda não havia a Av. Dantas Barreto. Suástica no dirigível mostra força do nazismo da época. (Acervo do Museu da Cidade do Recife).

O fim da era dos dirigíveis se deu em 1937, quando o Hindenburg pegou fogo em Nova Jérsei, nos EUA, matando 36 pessoas. "Além disso, o acirramento da Segunda Guerra Mundial também contribuiu para o fim das viagens, uma vez que a Alemanha estava bastante envolvida no conflito", diz Jobson. O LZ-127, o Graf Zeppelin, foi desmanchado em 1940 para sua estrutura ser utilizada na feitura de materiais bélicos. Durante essa guerra, a Marinha americana ocupa o Jiquiá e constrói paióis para a guarda de armamentos e munição. "É curioso como o Parque do Jiquiá guarda a memória dos dois principais lados do conflito".

Detalhe do desembarque dos passageiros do Zeppelin no Campo do Jiquiá. Recife, década de 1930. A imagem foi clicada da cabine do dirigível. Segundo Carl Bruer, que desembarcou do Zeppelin em 1931, a tripulação que os esperava em terra usava uniformes e capacetes de incêndio e trabalhava de forma rápida e, em um curto período de tempo, o Zeppelin estava ancorado. (Acervo Jobson Figueiredo). Detalhe do desembarque dos passageiros do Zeppelin no Campo do Jiquiá. Recife, década de 1930. A imagem foi clicada da cabine do dirigível. Segundo Carl Bruer, que desembarcou do Zeppelin em 1931, a tripulação que os esperava em terra usava uniformes e capacetes de incêndio e trabalhava de forma rápida e, em um curto período de tempo, o Zeppelin estava ancorado. (Acervo Jobson Figueiredo).

Dirigíveis hoje

A mesma empresa criadora dos primeiros Zeppelin ainda segue fabricando dirigíveis. "A tecnologia não ficou obsoleta, apenas mudou de função. Hoje os Zeppelins são utilizados em pesquisas científicas e de monitoramento", explica Jobson.

Aspecto de uma rua no Recife. Década de 1930. Esta imagem foi clicada por algum passageiro do Zeppelin. É possível perceber na banca de jornais e revistas em primeiro plano, no jornal A Notícia, a manchete: “O Graf Zeppelin em Recife”. (Acervo Jobson Figueiredo). Aspecto de uma rua no Recife. Década de 1930. Esta imagem foi clicada por algum passageiro do Zeppelin. É possível perceber na banca de jornais e revistas em primeiro plano, no jornal A Notícia, a manchete: “O Graf Zeppelin em Recife”. (Acervo Jobson Figueiredo).