Hemofilia: a esperança na terapia gênica para revolucionar o tratamento dos pacientes

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 28/11/2017 às 7:04
De origem adquirida ou hereditária, a hemofilia é uma doença hemorrágica caracterizada por desordens na coagulação sanguínea e hemorragias de gravidade variável, que podem ocorrer de forma espontânea ou pós-traumática (Foto ilustrativa: Pixabay)
De origem adquirida ou hereditária, a hemofilia é uma doença hemorrágica caracterizada por desordens na coagulação sanguínea e hemorragias de gravidade variável, que podem ocorrer de forma espontânea ou pós-traumática (Foto ilustrativa: Pixabay) FOTO: De origem adquirida ou hereditária, a hemofilia é uma doença hemorrágica caracterizada por desordens na coagulação sanguínea e hemorragias de gravidade variável, que podem ocorrer de forma espontânea ou pós-traumática (Foto ilustrativa: Pixabay)

Uma técnica capaz de inserir um gene saudável em células específicas pode revolucionar o tratamento de pacientes com doenças genéticas, como a hemofilia, e que atualmente necessitam utilizar medicamentos por toda a vida. Trata-se de um processo complexo, conhecido como terapia gênica, que se baseia na transferência de um gene saudável para as células do paciente, de modo que elas passem a produzir proteínas que antes não eram capazes de processar.

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Para que o gene terapêutico chegue às células-alvo, é necessário utilizar uma molécula transportadora, também chamada de vetor. Em geral, o vetor utilizado nos estudos de terapia gênica é um vírus geneticamente modificado para que seja capaz de transportar um pedaço do DNA humano normal, sem causar doença. Nesse processo, a patogenicidade do micro-organismo é reduzida, mas sem anular sua capacidade de invadir as células do paciente.

"Para entender o mecanismo de ação da terapia gênica, é importante observar a forma como os próprios vírus atuam ao infectar o corpo humano. Esses micro-organismos são capazes de transportar seus genes para as células hospedeiras, como parte de seus ciclos de replicação. A partir disso, as células humanas são levadas a produzir cópias desses vírus, infectando novas células. Diante desse mecanismo, o que os cientistas fizeram foi aproveitar essa capacidade dos vírus para fins terapêuticos", explica o diretor-médico da Pfizer, Eurico Correia.

Para utilizar os vetores virais, os cientistas se concentram em manipular esses agentes, de modo que seja possível remover deles os genes causadores de doenças e inserir genes terapêuticos. A ideia é, portanto, que eles possam transportar genes desejáveis para o interior das células. Agente causador do resfriado comum, o vírus adeno-associado (AAV), está entre as moléculas transportadoras mais utilizadas, tanto pela maior facilidade de manipulação que ele oferece como pela baixa probabilidade de reações imunológicas.

"A ideia é que o vetor descarregue seu material genético, contendo o gene terapêutico, na célula-alvo humana. Ao ser aplicado no corpo uma única vez, o medicamento estimula que as próprias células produzam a proteína desejada. Até o momento, as evidências clínicas em diferentes doenças indicam que a terapia gênica tem o potencial de restaurar a função normal das células, permitindo que os pacientes controlem a doença", ressalta Correia.

Aplicação

Na Pfizer, os estudos clínicos com a terapia gênica estão concentrados em doenças nas quais as alterações ocorrem em um único gene, como é o caso de algumas enfermidades hematológicas e neuromusculares. Destaca-se, nesse sentido, o programa clínico para o tratamento da hemofilia tipo B. Trata-se de uma droga órfã, em fase 2 de estudos clínicos.

De origem adquirida ou hereditária, a hemofilia é uma doença hemorrágica caracterizada por desordens na coagulação sanguínea e hemorragias de gravidade variável, que podem ocorrer de forma espontânea ou pós-traumática. Os pacientes podem apresentar deficiência do fator VIII de coagulação (hemofilia A) ou do fator IX (hemofilia B). Dados da Federação Mundial de Hemofilia indicam que a enfermidade acomete, ao todo, cerca de 12 mil pessoas no Brasil.

Em relação à terapia gênica, a expectativa é de que grande parte dos pacientes com a doença possa se beneficiar da técnica. Um dos critérios de elegibilidade nos estudos clínicos em andamento é a realização de exames de sangue para determinar a presença de anticorpos relacionados ao vetor utilizado. "Esperamos que esses pacientes possam contar com mais uma importante ferramenta para o tratamento da hemofilia, uma doença de forte impacto para a qualidade de vida dessas pessoas. A ideia é que eles tenham a chance de discutir, caso a caso, a melhor conduta com seus médicos", afirma Correia.

Atualmente, os pacientes com hemofilia podem contar com fatores de coagulação recombinantes, que são produzidos a partir de proteínas fabricadas por meio de técnicas biotecnológicas. Esses medicamentos, ao contrário do que ocorria no passado, não envolvem o plasma humano ou animal como matéria-prima, eliminando o risco de transmissão de doenças infectocontagiosas.