'Depressão acomete 28% das mulheres com diabetes em algum momento da vida', alerta psiquiatra

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 19/11/2017 às 22:46
Especialmente no climatério e pós-menopausa, a mulher com diabetes passa a ter um maior risco de doenças cardiovasculares e depressão, pois deixa de ter a proteção hormonal (Foto: Guga Matos)
Especialmente no climatério e pós-menopausa, a mulher com diabetes passa a ter um maior risco de doenças cardiovasculares e depressão, pois deixa de ter a proteção hormonal (Foto: Guga Matos) FOTO: Especialmente no climatério e pós-menopausa, a mulher com diabetes passa a ter um maior risco de doenças cardiovasculares e depressão, pois deixa de ter a proteção hormonal (Foto: Guga Matos)

Neste mês de conscientização sobre diabetes, a Federação Internacional de Diabetes (IDF, na sigla em inglês) volta o olhar para um grave problema de saúde pública: a enfermidade é uma das principais causas de morte entre as mulheres, o que torna inaceitável autoridades ficarem alheias ao fenômeno ou se limitarem a atitudes pontuais. Além de as pacientes com diabetes tipo 2 serem dez vezes mais propensas à doença cardiovascular, elas têm um risco aumentado de desenvolver depressão, em comparação com os homens, segundo a IDF.

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"A depressão é mais frequente em mulheres com a doença, acometendo 28% delas em algum momento da vida, em comparação com aquelas sem diabetes, cuja prevalência é de 16%. A hiperglicemia (nível muito alto de glicose no sangue) pode levar a sintomas depressivos", alerta o psiquiatra Amaury Cantilino, da Comissão de Estudos e Pesquisas da Saúde da Mulher da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Sobre o assunto, confira a entrevista do médico à jornalista Cinthya Leite.

Qual o elo entre depressão, diabetes e mulheres?

A frequência da depressão em mulheres com diabetes é maior do que a prevalência em homens com diabetes. Um estudo de metanálise (técnica estatística que combina resultados provenientes de diferentes pesquisas) mostrou que, em mulheres com diabetes, a depressão chega a atingir 28% delas em algum momento da vida. Nos homens, a prevalência desse transtorno psiquiátrico é de 18%. Entre aquelas sem diabetes, a depressão acomete 16%; entre os homens que não têm a doença, 8% são acometidos pela depressão. A diabete provoca hiperglicemia (nível muito alto de glicose no sangue), que pode levar a sintomas depressivos. E isoladamente a depressão aumenta os níveis de cortisol (hormônio relacionado ao estresse), que aumenta a taxa de glicose no sangue. Então, o resultado é um círculo vicioso, em que a depressão piora a diabetes, que piora os quadros depressivos. É uma coisa puxando a outra...

"A hiperglicemia pode levar a sintomas depressivos. E isoladamente a depressão aumenta os níveis de cortisol, que aumenta a taxa de glicose no sangue", frisa Amaury Cantilino (Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem)

Essa condição exige um cuidado especial para se prescrever medicamentos?

Quando se vai prescrever um medicamento para tratar a depressão a alguém com diabetes, especialmente se for no sexo feminino, é necessário um cuidado em relação ao antidepressivo que será utilizado. Afinal, as mulheres são bem mais sensíveis aos efeitos de ganho de peso (isso pode dificultar o controle da glicose) relacionados aos antidepressivos; alguns levam a um maior ganho de peso do que outros. Ou seja, o psiquiatra que vai tratar a paciente com diabetes deve prescrever um antidepressivo que envolva um risco de ganho de peso baixo.

Qual o impacto do diagnóstico de diabetes para a paciente?

Para algumas que já têm o histórico de depressão, receber o diagnóstico de diabetes e consequentemente passar a ter que adotar uma conduta de adaptação (mudança no estilo de vida, por exemplo) relacionada à doença pode favorecer o desenvolvimento de episódios novos de depressão.

Assista também à entrevista sobre depressão com Amaury Cantilino na TV JC:

Menopausa, depressão e diabetes também formam uma tríade que requer um olhar atento?

O climatério (fase de transição do período fértil para o não reprodutivo da mulher) é uma época em que há maior risco de desenvolvimento de depressão e também de diabetes, em comparação a outras fases da vida. O climatério favorece o aparecimento de episódios depressivos até mesmo em mulheres que nunca tiveram esse transtorno psiquiátrico, embora ele seja mais comum em quem tem histórico de depressão. Além disso, é uma época em que as mulheres apresentam alteração de metabolismo, o que pode favorecer a intolerância à glicose (condição que, na maioria das vezes, precede a diabetes). Então, geralmente, diabetes e depressão são dois diagnósticos que vão aparecer concomitantemente, em alguns casos, no climatério.

Nessa fase, a qualidade do sono pode ter algum impacto na saúde da mulher?

Durante o climatério, é muito frequente as mulheres terem alteração de sono. Às vezes, apresentam insônia primária (aquela sem relação com algum transtorno ou sintoma) e, outras vezes, têm insônia secundária aos fogachos (ondas de calor), que podem levar a um despertar à noite ou durante a madrugada. E a insônia também é um fator que predispõe a diabetes e a depressão. Quando se perde a regulação do relógio biológico (ciclo sono/vigília), a pessoa perde o ritmo circadiano (período de aproximadamente 24 horas sobre o qual se baseia o ciclo biológico, com influência da variação de luz, temperatura entre o dia e a noite). O esperado é que a pessoa tenha um pico de cortisol pela manhã, ao acordar, e que cai ao longo da tarde. Durante a noite e madrugada, o nível de cortisol fica bem baixo. Quando a pessoa tem insônia, perde esse ritmo circadiano, e o cortisol fica permanentemente alto. Isso também é um fator de risco para o aparecimento da diabetes.

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