'Renasci, e a ficha ainda não caiu', diz paciente que esperou mais de 500 dias por um novo coração

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 31/08/2017 às 14:56
"Os médicos diziam que só havia 4% de chance de encontrar um órgão compatível comigo. Mas no dia 11 de julho, foi encontrado um doador e fiz a cirurgia. Estou em recuperação", conta Agaliane Balbino de Souza (Foto: Leo Motta/JC Imagem)
"Os médicos diziam que só havia 4% de chance de encontrar um órgão compatível comigo. Mas no dia 11 de julho, foi encontrado um doador e fiz a cirurgia. Estou em recuperação", conta Agaliane Balbino de Souza (Foto: Leo Motta/JC Imagem) FOTO: "Os médicos diziam que só havia 4% de chance de encontrar um órgão compatível comigo. Mas no dia 11 de julho, foi encontrado um doador e fiz a cirurgia. Estou em recuperação", conta Agaliane Balbino de Souza (Foto: Leo Motta/JC Imagem)

As complicações da cardiopatia reumática fizeram a dona de casa Agaliane Balbino de Souza, 51 anos, deixar a cidade de Timbaúba, Zona da Mata Norte de Pernambuco, para morar no Recife à espera de um coração para salvar a sua vida. Viveu na expectativa do transplante por um ano e meio – período muito maior do que o tempo médio (45 dias após entrada na lista) dos pacientes em fila de espera por um coração.

“Os médicos diziam que só havia 4% de chance de encontrar um órgão compatível comigo. Mas no dia 11 de julho, foi encontrado um doador e fiz a cirurgia. Nasci novamente. Estou bem e em recuperação, mas a ficha ainda não caiu. Achava difícil aparecer um coração para mim”, conta Agaliane, que foi submetida à cirurgia no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip). "É um dos casos de transplante cardíaco mais bonitos que acompanhamos. Embora fosse pequena a chance de surgir um órgão para ela, não desistimos. A cada coração que aparecia, a gente testava. É uma vitória que comemoramos", relata o cirurgião cardiovascular Fernando Figueira, coordenador do Serviço de Transplante Cardíaco do Imip.

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Agaliane é uma das 40 pessoas que já passaram por um transplante cardíaco este ano em Pernambuco. O número ultrapassa o total de cirurgias do tipo (38) de todo o ano passado. No Estado, esse tipo de transplante é realizado no Real Hospital Português e no Imip. Esse último desponta atualmente, segundo a Secretaria Estadual de Saúde, como o maior centro transplantador de coração do Norte/Nordeste. De julho de 2012 (quando foi implementada a unidade de terapia intensiva na instituição e o bloco cirúrgico dedicados a transplantes) até agora, foram realizados 135 procedimentos no Imip. “Nenhum outro instituto, no Brasil, atingiu mais de 100 transplantes cardíacos em tão pouco tempo. Alcançamos essa marca em quatro anos”, informa o cirurgião cardiovascular Fernando Figueira, coordenador do Serviço de Transplante Cardíaco do Imip.

"O transplante de coração envolve um verdadeiro trabalho de equipe. Cada membro do time exerce uma função indispensável para a realização do procedimento. Isso carrega um simbolismo único: devolver a vida, como se fosse um toque de mágica", destaca o cirurgião cardiovascular Fernando Figueira (Foto: Divulgação)

De acordo com a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), Pernambuco está em segundo lugar no Brasil no número de transplantes de coração, atrás apenas de São Paulo. Os dados são do primeiro semestre de 2017. “O Estado se destaca, desde o início do ano, no número de transplantes de coração. Conseguir superar o volume de 2016, em menos de oito meses, mostra que a população tem entendido a importância do ato e, com isso, autorizado a doação do órgão”, diz a coordenadora da Central de Transplantes de Pernambuco, Noemy Gomes.

Atualmente dois pacientes esperam por um coração em Pernambuco. O número é bem pequeno, em comparação com a lista dos demais órgãos (765 pacientes, por exemplo, aguardam rim e outros 146, córnea). “Nossa luta agora é alimentar a fila de espera por um coração”, frisa Fernando Figueira. À primeira vista, o depoimento do médico soa estranho, num momento em que as campanhas de doação de órgãos propõem metas para se reduzir a fila de espera. Mas a questão é que muitos pacientes morrem sem ter a chance de entrar na lista, mesmo precisando de um novo coração.

“Pela sensibilidade do órgão, todos os profissionais envolvidos (com o transplante cardíaco) estão tomados pelo espírito de fazer o melhor possível, sabendo que não mais do que quatro horas separam o tempo máximo permitido entre o término da doação e a finalização do implante”, salienta Fernando Figueira. Ele complementa que o transplante cardíaco talvez seja o mais emblemático dos procedimentos, devido à adrenalina desprendida para fazer um órgão (inerte e sem movimento) voltar a bater, com força e saúde, no corpo de outra pessoa. “Esse processo carrega um simbolismo único: devolver a vida, como se fosse um toque de mágica”, destaca o médico.