Goma do cajueiro pode se tornar arma no tratamento do refluxo gastroesofágico

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 26/06/2017 às 10:29
Testes mostraram que a goma do cajueiro adere profundamente às células do esôfago, formando um biofilme e aumentando a resistência contra os danos causados pelo ácido gástrico (Foto ilustrativa: Pixabay)
Testes mostraram que a goma do cajueiro adere profundamente às células do esôfago, formando um biofilme e aumentando a resistência contra os danos causados pelo ácido gástrico (Foto ilustrativa: Pixabay) FOTO: Testes mostraram que a goma do cajueiro adere profundamente às células do esôfago, formando um biofilme e aumentando a resistência contra os danos causados pelo ácido gástrico (Foto ilustrativa: Pixabay)

Da Agência Fapesp 

Um polímero extraído do caule do cajueiro (Anacardium occidentale) pode se tornar uma importante ferramenta no tratamento da doença do refluxo gastroesofágico, condição que afeta cerca de 12% da população mundial, segundo experimentos conduzidos na Universidade Federal do Ceará (UFC).

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Resultados da pesquisa foram apresentados pelo professor do Departamento de Medicina Clínica da UFC, Marcellus Souza, e ex-bolsista de doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), durante o 3º Simpósio Internacional sobre Doenças Inflamatórias (Inflamma III). O evento foi realizado entre os dias 21 e 23 de junho, em Ribeirão Preto, pelo Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID) e pela Sociedade Brasileira de Inflamação (SBIn).

“Nos testes feitos com tecido de 33 pacientes, obtidos por meio de biópsia, observamos que a goma do cajueiro adere profundamente às células do esôfago, formando um biofilme e aumentando a resistência contra os danos causados pelo ácido gástrico. Nossa hipótese é que, além de conferir proteção tópica, o polímero também tenha ação anti-inflamatória”, disse Souza à Agência Fapesp.

A descoberta foi possível graças a um modelo experimental desenvolvido na UFC capaz de mimetizar em camundongos a forma mais prevalente da doença: o refluxo gastroesofágico não erosivo. O método foi descrito em um artigo publicado no dia 8 de junho no American Journal of Physiology. “Entre 60% e 70% dos pacientes com refluxo apresentam o fenótipo não erosivo da doença. Embora tenham sintomas como azia, o exame de endoscopia não indica a existência de lesão no tecido do esôfago”, explicou Souza.

Com o objetivo de mimetizar essa condição nos animais, os cientistas realizaram um procedimento cirúrgico para amarrar o piloro – válvula que controla a passagem do conteúdo gástrico para o duodeno. Além disso, amarraram o fundo do estômago, para impedir o órgão de se expandir.

“Desse modo, o estômago fica cheio, não consegue aumentar seu volume e isso faz com que ocorra o retorno do conteúdo gástrico para o esôfago. Cerca de três dias após o procedimento, a inflamação no tecido atinge o auge. Também é possível observar uma dilatação nos espaço entre as células do esôfago, o que causa um comprometimento da barreira epitelial característico da doença”, contou Souza.

Em um dos grupos de camundongos, os pesquisadores iniciaram, logo após o procedimento cirúrgico, um tratamento por via oral com a goma purificada do cajueiro. O polímero foi obtido graças a uma colaboração com pesquisadores da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Os animais receberam a terapia uma vez por dia durante uma semana. Ao final, foram sacrificados para que o tecido do esôfago pudesse ser analisado e comparado com o de animais não tratados.

“Nossos resultados mostram que a goma do cajueiro reduziu o edema e a permeabilidade do tecido. Ou seja, ao combater a inflamação, a terapia manteve íntegra a barreira epitelial, impedindo os ácidos gástricos de atravessar para a região abaixo do epitélio, onde podem ativar receptores envolvidos na sensação de dor (azia)”, explicou.

Em testes feitos in vitro, com biópsia de pacientes, o grupo também observou uma redução na permeabilidade do tecido do esôfago após o tratamento com a goma do cajueiro.

“No momento, estamos realizando estudos de toxicidade para avaliar a segurança e definir a dose ideal para que, futuramente, possam ser realizados ensaios clínicos com o polímero”, afirmou Souza.

De acordo com ele, quase metade dos pacientes acometidos pela forma não erosiva do refluxo gastroesofágico não respondem ao tratamento convencional, feito com medicamentos da classe dos inibidores da bomba de prótons, como o omeprazol e o pantoprazol. “Há, portanto, uma grande necessidade de desenvolver novos métodos terapêuticos. Para isso, precisamos entender por que esses pacientes sentem dor mesmo não apresentando lesão no esôfago”, comentou.

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