Pesquisa do HC investiga relação entre câncer de intestino e esquistossomose

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 23/05/2017 às 7:00
Relação entre doenças começou a ser investigada após oncologista do Hospital das Clínicas atender dois casos suspeitos em menos de uma semana (Foto: Diego Nigro / JC Imagem)
Relação entre doenças começou a ser investigada após oncologista do Hospital das Clínicas atender dois casos suspeitos em menos de uma semana (Foto: Diego Nigro / JC Imagem) FOTO: Relação entre doenças começou a ser investigada após oncologista do Hospital das Clínicas atender dois casos suspeitos em menos de uma semana (Foto: Diego Nigro / JC Imagem)

Um estudo desenvolvido no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC/UFPE) analisa a relação entre a esquistossomose, doença grave que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, e o desenvolvimento do câncer colorretal. Se confirmada a hipótese de que o Schistosoma mansoni induziu o câncer, os resultados podem servir para nortear novos caminhos da medicina para o rastreamento de tumores malignos que se originam no intestino grosso ou no reto daqueles pacientes afetados pelo parasita.

Leia também:

» Campanha alerta sobre prevenção e combate ao câncer colorretal

» PE: O desafio de barrar a esquistossomose no Estado com mais mortes pela doença

» De zika a sífilis: Saiba quais doenças mais preocuparam os pernambucanos em 2016

» Movimento #VaiPorMim alerta para a gravidade do câncer de intestino

Conduzido pelo oncologista Gustavo Godoy, o estudo teve início no início do segundo semestre de 2016, quando o médico atendeu, no intervalo de uma semana, dois pacientes jovens em tratamento de câncer de cólon e com a verminose. Para comprovar a teoria, a equipe de pesquisadores iniciou um levantamento para encontrar, entre os cerca de 300 pacientes com câncer de cólon operados no Hospital das Clínicas, nos últimos dez anos, aqueles pacientes que foram atendidos no ambulatório de gastroenterologia, onde os pacientes com esquistossomose são acompanhados. Até o momento, uma média de 80 pessoas foram localizadas.

“Agora estamos fazendo um estudo epidemiológico, revisando as lâminas com amostras dos oitenta casos. Depois passaremos para uma fase de testes genéticos”, explica o oncologista, envolvido em pesquisas clínicas desde a residência médica na capital paulista e doutorado na Universidade de São Paulo (USP). O levantamento também contou com o apoio do chefe do Serviço de Oncologia do Hospital das Clínicas, Luiz Alberto Mattos.

Imagem de caramujos (Foto: Agência Brasil) O parasita utiliza caramujos de água doce como hospedeiros intermediários (Foto: Agência Brasil)

A primeira das mudanças se for confirmada a relação será a faixa etária considerada favorável para o surgimento de câncer de cólon. “O processo inflamatório causado pelos ovos do Schistossoma é muito intenso. Como as pessoas, geralmente, adquirem a doença na infância, o estímulo para o desenvolvimento do câncer acontece mais cedo. A idade a partir da qual o câncer de intestino acomete a população em geral é após os 50 anos. Nessa faixa etária, já indicamos a realização de colonoscopia para rastreamento de câncer colorretal. Se confirmarmos essa relação causal entre a parasitose e o câncer, o rastreamento da população infestada pelo nematoide deverá começar mais cedo", detalha.

Outro ponto analisado no estudo é em relação às localidades com maior incidência de pessoas infectadas pelo chistossoma. “Ao investigar os dados de incidência de câncer colorretal, constatamos que as regiões com maior número de casos de câncer colorretal eram também as principais áreas endêmicas para esquistossomose. Será que se trata apenas de uma coincidência?”, questiona Godoy.

Dez profissionais estão participando do estudo, entre estudantes de medicina vinculados a projetos de iniciação científica da UFPE e médicos ligados aos serviços de patologia, gastroenterologia e oncologia do Hospital das Clínicas. Os primeiros dados da pesquisa foram publicados no congresso passado e na revista da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Journal of Global Oncology). O assunto também foi destaque em edição da revista Oncologia & Oncologistas, publicação científica da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC). Até o fim deste ano o estudo deve ser concluído.

A doença

A esquistossomose é adquirida quando as pessoas entram em contato com água doce infectada por formas larvas de parasitas da espécie Schistosoma. São cinco espécies diferentes da espécie. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença afeta cerca de 240 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, aproximadamente 25 milhões de pessoas vivem sob o risco de infestação pelo Shistosoma mansoni, espécie predominante no País.

Nos primeiros dias após a infecção, a pessoa pode apresentar uma erupção cutânea e/ou coceira no local em que o parasita penetrou na pele. A maioria das pessoas, no entanto, não têm sintomas na fase inicial. Depois de um a dois meses após a infecção, quando o parasita chega no sangue e viaja através da corrente sanguínea, o paciente pode apresentar diversos sintomas, como febre, calafrios, tosse e dores musculares.

O parasita pode também passar para o fígado, intestino ou bexiga. A esquistossomose intestinal pode causar, entre vários sintomas, dor abdominal, diarreia e sangue nas fezes.