Baleia Azul: "Recife não possui serviço de apoio a adolescentes", alertam psiquiatras

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 04/05/2017 às 22:37
"Nós precisamos falar sobre o suicídio de jovens e como podemos agir na prevenção dos transtornos que os adolescentes enfrentam", defendeu a psiquiatra Kátia Petribu durante audiência pública sobre o desafio da Baleia Azul (Foto: Amanda Rainheri / Jornal do Commercio)
"Nós precisamos falar sobre o suicídio de jovens e como podemos agir na prevenção dos transtornos que os adolescentes enfrentam", defendeu a psiquiatra Kátia Petribu durante audiência pública sobre o desafio da Baleia Azul (Foto: Amanda Rainheri / Jornal do Commercio) FOTO: "Nós precisamos falar sobre o suicídio de jovens e como podemos agir na prevenção dos transtornos que os adolescentes enfrentam", defendeu a psiquiatra Kátia Petribu durante audiência pública sobre o desafio da Baleia Azul (Foto: Amanda Rainheri / Jornal do Commercio)

"Não existe nenhum serviço que possa dar suporte a esses adolescentes. Essa discussão sobre o desafio da Baleia Azul acende o alerta da necessidade de abertura de serviços de saúde mental a nível primário, secundário e terciário. Se um adolescente tenta suicídio hoje, ele vai para onde? Provavelmente para o Hospital da Restauração ou Imip. E depois? Ele vai para casa. E quando vai conseguir consulta? Nós precisamos entender que estamos vulneráveis", foi assim que a psiquiatra Kátia Petribú, presidente da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria (SPP), traçou o panorama da rede de assistência à saúde mental no Recife durante audiência pública na tarde desta quinta-feira (4) na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).

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A solicitação do debate presidido pela Comissão de Cidadania da Alepe partiu da deputada Terezinha Nunes (PSDB). Além de membros da SPP e psicólogos especialistas na infância e adolescência, foram convidados para a audiência representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), das secretarias estaduais de Defesa Social (SDS-PE), de Desenvolvimento Social Criança e Juventude (SDSCJ) e de Educação, Ministério do Trabalho e Emprego, das polícias Civil e Federal, Conselho Estadual de Educação (CEE) e Arquidiocese de Olinda e Recife.

Ao longo de duas horas, parlamentares e entidades convidadas colocaram na pauta os principais pontos sobre o jogo que têm deixado pais em alerta. "É evidente que estes jogos estão influenciando os jovens. Mas o principal ponto discutido na audiência foi a constatação que o desafio da baleia azul não é o único problema que estamos enfrentando. O grande problema é a depressão infantojuvenil. Esses jovens estão sendo abandonados pelas famílias. Os pais não buscam o diálogo com os filhos, que por sua vez, se sentem isolados e acabam encontrando na internet esses programas", pontuou a deputada.

Imagem da psiquiatra Milena França (Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem) A rede de assistência à saúde mental não está completa. E o pior é que os pais desses adolescentes estão adoecendo junto com os filhos", pontua a psiquiatra Milena França, do Hospital Ulysses Pernambuco (Foto: Bobby Fabisak / JC Imagem)

Para a psiquiatra Milena França, da diretoria da SPP, não restam dúvidas de que a rede de saúde mental da capital pernambucana está sobrecarregada. "Seja na atenção básica, Centros de Atenção Psicossocial (Caps), ambulatórios ou rede hospitalar, não há estrutura para os adultos e muito menos para as crianças e adolescentes. Nós temos déficit de psiquiatras especializados na infância e adolescência. Outros especialistas nessas áreas estão em cargos assistenciais de adultos por falta de investimento em serviços para esses especialistas prestarem atendimento à população menor de idade. Os Caps da infância e adolescência (CAPSi) estão superlotados e não têm mais como absorver a demanda. O ambulatório do Imip (Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira), por exemplo, está com uma fila de espera gigantesca", explica.

Para a especialista, preceptora das residências médicas em psiquiatria do Hospital Ulysses Pernambucano (HUP) e do Imip, o que mais preocupa os psiquiatras é a falta de estrutura das famílias atendidas. "Além do caos total na rede, os pais estão adoecendo junto. O problema se tornou uma bola de neve. O que precisamos, primeiramente, é uma família mais estruturada e presente na vida do adolescente, em todos os aspectos. Os pais precisam estar atentos aos mínimos sinais de comportamento desviantes dos observados anteriormente nos jovens. Aqueles mais vulneráveis a serem influenciados, são o principal alvo de uma atuação e intervenção precoce por parte da família. E, se caso fosse necessário, deveria haver uma assistência adequada em todos os planos de atendimento em saúde mental. Mas isso está muito longe de ser adequado", lamenta.

O secretário de Saúde do Recife, Jailson Correia, reconheceu que realmente não existe um serviço especializado na capital pernambucana para prevenção ao suicídio, mas defendeu que as Caps estão aptas a receber esses pacientes. "Temos dois Caps que lidam diariamente com o público infantojuvenil. E outro que presta apoio a dependentes de álcool e outras drogas", defende. Ainda segundo Correa, os pacientes em quadros depressivos ou com outros transtornos mentais e seus familiares atendidos nas unidades de saúde da capital são acompanhados por uma equipe de atendimento psicossocial após a alta hospitalar.