Conheça a tricotilomania, distúrbio que causa a compulsão em arrancar cabelo

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 22/02/2017 às 8:00
Mania de arrancar cabelo faz parte do grupo de transtornos com origem na mente e agravadas por fatores diversos, como estresse e ansiedade (Foto ilustrativa: Pixabay)
Mania de arrancar cabelo faz parte do grupo de transtornos com origem na mente e agravadas por fatores diversos, como estresse e ansiedade (Foto ilustrativa: Pixabay) FOTO: Mania de arrancar cabelo faz parte do grupo de transtornos com origem na mente e agravadas por fatores diversos, como estresse e ansiedade (Foto ilustrativa: Pixabay)

Você já ouviu falar em tricotilomania? Apesar do nome estranho, que a princípio não nos lembra algo específico, o termo remete a uma condição muito comum relatada por pacientes nos consultórios médicos: a mania de arrancar fios de cabelo. O distúrbio faz parte do grupo de transtornos do espectro psicossomático, ou seja, aquelas compulsões com origem na mente e agravadas por fatores diversos, a exemplo do estresse e ansiedade do cotidiano.

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"A forma mais comum da doença é arrancar fios do couro cabeludo. Mas alguns pacientes também chegam a arrancar fios da sobrancelha e até dos cílios. Em geral, é uma compulsão um pouco mais frequente no sexo feminino, com variadas apresentações na infância e na fase adulta", explica a dermatologista Mariana de Andrade Lima, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD).

A grande preocupação dos especialistas é a dificuldade em fechar o diagnóstico, já que muitas vezes o paciente tem vergonha de relatar durante a consulta a mania de arrancar cabelo. "Nem sempre os pacientes estão dispostos a dizer que arrancam fios de cabelo. Por isso, a abordagem é muito difícil e o tema tem que ser tratado com bastante delicadeza. Porém, é uma doença muito mais comum do que se imagina. Vale reforçar que o paciente não deve se sentir culpado de forma alguma. É uma desordem que precisa de tratamento como outras doenças", ressalta Mariana.

A jornalista Débora Albuquerque, 24 anos, convive com o hábito desde a infância, mas foi apenas na adolescência que passou a arrancar os fios de cabelo com mais frequência. "Desde que me entendo por gente que tenho mania de arrancar o cabelo. Lembro que quando mais nova eu percebia que, nas aulas que eu não gostava muito, ficava sempre arrancando os fios. Só vim perceber que fazia isso com frequência na adolescência, quando meus amigos me avisaram. O hábito passou a ser frequente, não apenas quando eu estava ociosa", conta.

Apesar de entender que convive com um transtorno, Débora ainda não procurou tratamento. "Eu percebo que (a compulsão) aumenta quando estou aflita. Com o passar do tempo, passei a pesquisar sobre o assunto e entendi que é um transtorno de ansiedade. Displicentemente, nunca procurei ajuda médica para entender o problema", explica a jornalista.

Na maioria das vezes, o tratamento é feito com uma equipe multidisciplinar. Envolve o dermatologista, que cuidará das lesões causadas no couro cabeludo e um psicólogo para investigar as causas da compulsão. Em casos mais sérios, os pacientes também são encaminhados para o psiquiatra. "Existem casos dramáticos nos quais o paciente chega a arrancar a pele do couro cabeludo. Mas, no geral, é uma forma de alopécia totalmente reversível. No momento que o paciente deixar de arrancar os fios, o couro cabeludo é totalmente capaz de produzir outros fios. Na dermatologia, usamos medicação oral e loções na região afetada. Mas é importante ressaltar que o tratamento geralmente inclui uma equipe multidisciplinar", pontua a dermatologista.

Acompanhamento multidisciplinar

Nos casos mais leves, a psicoterapia é um importante aliado no tratamento. "Na tricotilomania, a pessoa arranca o cabelo sem nem se dar conta. Todo hábito que temos passa pelas seguintes fases: intenção, ponderação, deliberação e ação. Nestes casos dos atos impulsivos, há uma espécie de curto-circuito desse processo e o paciente passa direto para a fase da ação sem fazer as ponderações. A psicoterapia vai ajudar o paciente a se dar conta de quais momentos funcionam como gatilho para o problema. O intuito é fazer com que a pessoa se sensibilize sobre essas situações para aumentar o grau de alerta nesses momentos e substituir o ato por outras ações", explica o psiquiatra Amaury Cantilino, especialista em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento.

Assim como outros transtornos dessa ordem, a genética é um dos fatores que podem ser a origem do distúrbio. Mas causas ambientais também agravam o distúrbio. "O estresse e a ansiedade são fatores que mais levam à exacerbação do transtorno. Geralmente são pessoas com tendência para a impulsividade, não só em relação à esse comportamento, mas também outros tipos de conduta", esclarece Cantilino.

Em casos mais graves, quando é necessário entrar com medicamentos, as primeiras opções são remédios que agem na inibição seletiva de captação da serotonina, neurotransmissor responsável, entre várias funções, pela sensação de bem-estar. "Da mesma forma que ocorre com o transtorno obsessivo compulsivo (TOC), há diminuição de disponibilidade da serotonina em algumas sinapses, que são os espaços de conexões entre os neurônios (mas não nas mesmas da depressão). Esses medicamentos aumentam os níveis de serotonina nestas sinapses", finaliza.