Pesquisadores desenvolvem aplicativo de celular para apoiar no diagnóstico de malária

Cinthya Leite
Cinthya Leite
Publicado em 28/07/2015 às 12:49

A malária é causada pelo parasita unicelular protozoário Plasmodium, transmitido pela picada da fêmea infectada do mosquito Anopheles (Foto: Free Images) A malária é causada pelo parasita unicelular protozoário Plasmodium, transmitido pela picada da fêmea infectada do mosquito Anopheles (Foto: Free Images)

Da Agência Fapesp

Com o objetivo de facilitar o diagnóstico de malária em áreas remotas do globo, está sendo desenvolvido por pesquisadores da Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos um aplicativo para smartphones que utiliza um sistema automatizado para detecção e contagem de parasitas da doença.

A tecnologia foi apresentada no IEEE International Symposium on Computer-Based Medical Systems (CBMS), realizado, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de 22 a 25 de junho no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC), em São Carlos, e na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), ambos da Universidade de São Paulo (USP).

“A malária é uma doença curável, mas diagnósticos inadequados e a resistência às drogas emergentes ainda são barreiras para a redução da mortalidade. É preciso desenvolver vacinas e controlar o mosquito transmissor, entre outras medidas, mas o desenvolvimento de um teste para diagnóstico rápido e confiável é uma das formas mais promissoras de combate à doença”, explicou o pesquisador Sameer Antani, da Biblioteca Nacional de Medicina, ligada aos National Institutes of Health (NIH).

Para isso, disse o pesquisador, foi necessária interação entre profissionais da saúde, cientistas da computação e engenheiros. “Foi do diálogo entre as necessidades clínicas do cuidado com a saúde da população no campo e engenheiros e pesquisadores de áreas ligadas à computação que surgiu essa nova abordagem de combate à malária, desenvolvida para atender à demanda urgente pelo controle da doença, mas de forma adaptada à realidade do trabalho em áreas com necessidades muito particulares”, contou.

Para automatizar a detecção e contagem de parasitas da malária, relatou Antani, o projeto contou com o apoio do Departamento de Saúde e Serviços Humanos do país e com uma parceria de pesquisa entre a Mahidol University, da Tailândia, e a Oxford University, do Reino Unido, que juntas criaram a Mahidol Oxford Tropical Medicine Research Unit.

Cuidado: parasita!

A malária é causada pelo parasita unicelular protozoário Plasmodium, transmitido pela picada da fêmea infectada do mosquito Anopheles. O diagnóstico da doença é feito com a ajuda de exames microscópicos, que possibilitam identificar os parasitas em amostras de sangue.

De acordo com Antani, mais de 170 milhões de filmes de sangue são examinados a cada ano com esse fim e a contagem dos parasitas para definir se os casos diagnosticados são graves ou não complicados, seguindo a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), geralmente é manual.

“A contagem precisa desses parasitas é fundamental para o diagnóstico correto da doença e para o sucesso do tratamento, influenciando, por exemplo, na eficácia das drogas. No entanto, os diagnósticos microscópicos não são padronizados e dependem muito da experiência e da habilidade do microscopista”, avaliou.

Para o pesquisador, isso dificulta o diagnóstico e o controle da malária em locais com poucos recursos e com alta incidência da doença. “Essa dificuldade pode levar a decisões equivocadas no tratamento. Nos casos de falso negativo, além dos danos óbvios à saúde do indivíduo infectado, isso significa a necessidade de uma nova consulta, dias perdidos de trabalho, recursos gastos desnecessariamente. Já nos casos de falso positivo, o diagnóstico pode levar ao uso desnecessário de medicamentos e a sofrimento por conta de uma série de potenciais efeitos colaterais, como náusea, dores abdominais, diarreia e complicações graves”, ponderou.

A solução desenvolvida pelos pesquisadores automatiza a detecção do parasita e sua contagem a partir de esfregaços de sangue, uma camada fina de sangue disposta sobre uma lâmina de microscopia e que é colorida de forma a permitir que diferentes células sejam examinadas.

Antani explicou que a contagem automatizada dos parasitas tem uma série de vantagens se comparada ao método convencional. “Além de fornecer uma interpretação mais segura, essa automatização reduz custos e possibilita que mais pacientes sejam atendidos em menos tempo, facilitando o trabalho em campo nas áreas de maior incidência da doença.”

O sistema funciona por meio de métodos de aprendizagem de máquina, campo da inteligência artificial que desenvolve algoritmos e técnicas que permitem ao computador apreender determinados padrões para aperfeiçoar seu desempenho em tarefas específicas.

Com base em padrões de imagens digitais adquiridas por equipamentos de microscopia de luz convencionais, o software aprende a aparência típica dos parasitas e os identifica em fotografias dos esfregaços de sangue, realizando em seguida sua contagem e discriminando as células infectadas.

Aplicada a smartphones, a tecnologia se torna portátil e pode ser levada a campo. Para Antani, o desenvolvimento do sistema pode beneficiar populações de diferentes nações que ainda sofrem com a malária, como o Brasil.

“A malária mata mais de 600 mil pessoas por ano, a maioria na África, onde uma criança morre a cada minuto vitimada pela doença. Muitas que sobrevivem acabam sendo acometidas por deficiências neurológicas. Mas a malária é um problema global: são cerca de 200 milhões de casos em todo o mundo, incluindo o Brasil. O desenvolvimento de uma tecnologia portátil de baixo custo e alta precisão para diagnóstico da doença tem grande potencial para auxiliar no combate à doença e nos esforços pela sua erradicação.”

De acordo com a OMS, o Brasil reduziu em 75% o número de infecções em território nacional desde 2000, mas a incidência da doença ainda é alta, especialmente na Amazônia: em 2013 o país teve 177.767 casos diagnosticados e 41 óbitos foram registrados.